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sexta-feira, 30 de agosto de 2024

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: "Boas Raparigas"



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Boas Raparigas”,
de Manuel Pinheiro da Rocha
Museu de Lamego
22 Jun > 27 Out 2024


Mãe extremosa, esposa dedicada, uma verdadeira fada do lar. Valorizados e incentivados no tempo do Estado Novo, eram estes os atributos conferidos às mulheres ideais, afastadas do espaço público, sem acesso a certas profissões, com direitos muito limitados, numa doce submissão aos maridos. Desde pequeninas que eram treinadas para serem assim, rendidas ao poder patriarcal dos pais, dos irmãos e, mais tarde, dos maridos. O único futuro que podiam ambicionar era o de fazerem um bom casamento que garantisse o sustento da família que, a todo o custo, tinha de se manter unida, estável e forte: uma metáfora do próprio regime. Maria Lamas, no admirável documento sociológico que é “As Mulheres do Meu País”, provou que as mulheres portuguesas não eram exactamente tão “fadas do lar” como o regime as pintava, e que podíamos vê-las nos mais diversos trabalhos, nos campos como nas fábricas, lado a lado com os homens. A questão é que ganhavam pouco mais de metade do que o salário pago aos homens.

“Boas Raparigas. Lamego nas décadas de 1930-1950 por Manuel Pinheiro da Rocha” parte de um conjunto de imagens recolhidas em Lamego, pelo fotógrafo Manuel Pinheiro da Rocha, um alfaiate que nasceu em 1893, na freguesia de Britiande, Lamego, e que aos 18 anos de idade se muda para o Porto, onde se fixa na rua de Santa Catarina, como alfaiate e amador de fotografia, por influência do fotógrafo Domingos de Alvão, que tinha o seu estabelecimento no mesmo prédio da alfaiataria. Na fotografia, era primoroso. Um génio. Tinha as melhores lentes, pois dizia que a máquina estava para o fotógrafo como o pincel para o pintor, escreveria o filho, Fernando Pinheiro da Rocha, sobre o pai. Com efeito, a amizade com o fotógrafo e outros conhecidos artistas do seu tempo, como Joaquim Lopes, Acácio Lino, Jaime Isidoro, Teixeira Lopes ou António Fernandes, com quem habitualmente dava passeios para pintar e fotografar, seriam decisivos para o seu percurso na fotografia. Foi sócio fundador da Associação Fotográfica do Porto e presidente do Grémio Português de Fotografia, participando em inúmeros salões de Fotografia, realizados não só em Portugal, mas também pela Europa e nos Estados Unidos. No cinema, colaborou no documentário de Arthur Duarte e João Moreira, Barqueiros do Douro e na revista Movimento sobre Cinema.

Sem nunca perder de mira as suas raízes, Manuel Pinheiro da Rocha deslocava-se frequentemente a Lamego, fazendo-se acompanhar da inseparável câmara fotográfica, para nos deixar um legado imenso, de valor documental inestimável, sobre Lamego no segundo quartel do século XX. É no meio de uma obra rica de conteúdo e significado, esteticamente cuidada e evoluída e com uma enorme preocupação antropológica que vamos encontrar as representações da mulher da época, dando azo ao título da exposição o qual arrasta consigo uma ponta de ironia e vem-nos dizer da condescendência de quem tinha privilégios exclusivos em relação à mulher: elas governavam a casa, eles mandavam no mundo. Dando continuidade ao trabalho de divulgação em Lamego da obra de Manuel Pinheiro da Rocha, a exposição “Boas Raparigas” divide-se entre fotografia de reportagem, de retrato e paisagem, datada das décadas de 1930-1950, para nos devolver imagens de uma cultura visual da mulher disseminada durante o Estado Novo, suas representações e papéis sociais, sustentados por uma estética e sensibilidade marcadamente masculinas. Para ver até 27 de Outubro.

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