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domingo, 25 de fevereiro de 2018

TERTÚLIA: "Conversas Úteis", com Álvaro Domingues



TERTÚLIA: “Conversas Úteis”,
com Álvaro Domingues
Museu de Ovar
24 Fev 2018 | sab | 21:30


Se de utilidade falamos quando falamos de “Conversas Úteis” - conjunto de tertúlias promovidas com espantosa regularidade pelo Museu de Ovar em torno de livros, autores e leitores -, então o capítulo mais recente destes encontros terá batido aos pontos os demais. Tendo o seu novo livro, “Volta a Portugal”, como ponto de partida, Álvaro Domingues deu uma verdadeira aula sobre o território português, desconstruindo a ideia do país-mosaico e desmontando os clichés habituais que concorrem para a ideia (impingida) de unidade territorial. Fê-lo apoiando-se num discurso esclarecido e extraordinariamente acessível e ainda em fotografias da sua autoria, convidando o público a refletir sobre o muito que se esconde por detrás de cada imagem, de cada mensagem.

Esta utilidade foi tanto mais útil, passe o pleonasmo, quanto a leitura que havia feito do livro não gerara em mim grandes entusiasmos. Houve, assim, a possibilidade de perceber um objectivo fundamental de Álvaro Domingues ao escrever o livro: Transportar o leitor para uma determinada ambiência, oferecer-lhe ferramentas para compreender aquilo que se esconde por detrás das palavras e das imagens, conceder-lhe total liberdade para relacionar as coisas entre si e esperar que seja ele a encontrar a unidade do livro. “Volta a Portugal” é, pois, uma “obra aberta”, aberta a várias leituras, a vários sentidos, assente numa escrita hipertextual, visto ser esta a que melhor se adapta ao estilo e aos motivos do livro. Entendidas assim as coisas, importa um regresso à leitura de Volta a Portugal” para tirar teimas.

Ao longo de duas horas que passaram num ápice falou-se, entre muitas outras coisas, da estranheza desta nova vida na esfera dos livros - “tenho alguma dificuldade em ouvir as pessoas dizerem que sou escritor” - e do desassossego dum professor de Geografia a dar aulas numa Faculdade de Arquitectura. Falou-se de textos que remontam ao Século XVI e de fotografias ao encontro dos “emissores de sinais” que são “aquelas gentes que habitam aquelas terras”. Falou-se da relação poética “cidade-campo” ser, na realidade, uma relação de “poder-dominação” e da urbanização ser, à escala planetária, “o grau zero da condição humana”. Também de toiros bravos e de puro Ribatejo, de framboesas e de Nepaleses, de burros que já não puxam carroças e passaram a ser meros elementos decorativos, de faianças e camelos, de papoilas e morangos e ópio e Beatles. Ainda de globalização e de desterritorialização - “essa palavra estranha para um geógrafo” -, do rural versus o neo-rural, duma paisagem que existe para ser mudada e dum Portugal pós-moderno que nunca chegou a ser moderno. E falou-se de “Entre nós... da auto-estrada”, um livro que vem a caminho e onde iremos “tentar perceber como é que um dispositivo socio-técnico tão performativo influencia o território, o espaço e a paisagem”. Vamos estar atentos!

1 comentário:

  1. Belo texto Joaquim, não mudaria uma palavra! Para quem não viu, o Joaquim tirava apontamentos durante o nosso serão no Museu de Ovar ... se este texto fosse de avaliação das matérias discutidas, dava-lhe 22 numa escala de 0 a 20!! Abraço e obrigado.

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