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domingo, 6 de julho de 2025

CONCERTO: Trios de Schubert | Pedro Burmester, Pedro Meireles, Filipe Quaresma



CONCERTO: Trios de Schubert
Com | Pedro Burmester (piano), Pedro Meireles (violino), Filipe Quaresma (violoncelo)
FIME - Festival Internacional de Música de Espinho
Auditório de Espinho - Academia
04 Jul 2025 | sex | 21:30


A caminhar para o fim, o 51º FIME - Festival Internacional de Música de Espinho teve para oferecer aos amantes da grande música um concerto verdadeiramente imperdível na noite da passada sexta-feira. Interpretados por Pedro Burmester (piano), Pedro Meireles (violino) e Filipe Quaresma (violoncelo), os Trios com piano n.º 1 e n.º 2, de Franz Schubert, chamaram ao Auditório de Espinho um público atento e interessado que voltou a esgotar a lotação da sala. Fazendo gala de uma enorme sensibilidade, cumplicidade e virtuosismo, os três instrumentistas mergulharam no universo intimista e nostálgico do compositor, expressando com emoção o espírito imaginativo, lírico e melódico que fizeram dele uma das traves mestras da passagem do estilo clássico para o romântico e que o tornam, muito justamente, num dos maiores compositores do século XIX. Escritas pouco antes da sua morte, estas duas obras de Schubert têm a uni-las o facto de serem compostas por quatro andamentos e terem uma escala incomumente grande para trio com piano, levando mais de quarenta minutos cada uma para serem executadas. Isso, e um certo sabor de improviso, o que as torna vivas, espontâneas, calorosas, sentimentais e imaginativas.

Concluído em 1828, o Trio com piano n.º 1, em Si Bemol Maior, D. 898, só viria a ser publicado em 1836 como Opus 99, oito anos após a morte de Schubert. O primeiro andamento, Allegro moderato, apresenta-se em forma de sonata, com um primeiro tema caracterizado por ritmos pontuados e durações de frases irregulares, enquanto o segundo tema, em contraste, apresenta melodias líricas e frases regulares. A secção de desenvolvimento expande ambos os temas, tornando-se por vezes turbulenta e apresentando versões fragmentadas do tema principal numa sucessão de tonalidades, cada uma mais próxima da tonalidade central do que a anterior. Andante un poco mosso, o segundo andamento, segue o estilo de uma canção de gôndola, com uma melodia cadenciada e ritmo oscilante. Como alguns dos outros movimentos lentos tardios de Schubert, há uma secção contrastante mais turbulenta para, de pronto, a calma ser restaurada. Scherzo: Allegro, o terceiro andamento, segue a forma clássica do minueto. O scherzo propriamente dito apresenta um contraponto pesado, com os três instrumentos imitando-se constantemente, ao passo que a secção do trio é uma valsa descontraída. No último andamento, Rondo: Allegro vivace - Presto, predomina um ritmo de dois compassos, a música terminando com uma coda marcada Presto.

O Trio com piano nº 2, em Mi Bemol Maior, D. 929, data de Novembro de 1827 e foi também uma das últimas composições concluídas por Franz Schubert. Publicado pela Probst como Opus 100 no final de 1828, pouco antes da morte do compositor, e apresentado pela primeira vez numa festa privada, em Janeiro de 1828, para celebrar o noivado do amigo de escola de Schubert, Josef von Spaun, o Trio foi uma das raras composições do período final de Schubert que teve a possibilidade de ouvir serem executadas antes de sua morte. Tal como na peça anterior, também aqui o primeiro andamento, Allegro, se apresenta em forma de sonata. Sobejamente conhecido, Andante com motto, o segundo andamento, assume uma forma ternária dupla assimétrica e viu o tema principal ser usado como musica central no filme “Barry Lyndon”, de Stanley Kubrick, e numa enorme quantidade de outros filmes, séries e documentários. O terceiro andamento, Scherzo: Allegro moderato é uma peça animada em formato ternário duplo padrão. O quarto andamento, Allegro moderato, é em forma de sonata rondo e nele Schubert incluiu, em dois interlúdios, o tema de abertura do segundo movimento numa versão alterada.

O final da interpretação desta última peça teve num veemente e prolongado aplauso a eloquente demonstração do apreço do público pelo excepcional serão proporcionado. Os músicos responderam agradecidos com a interpretação do Notturno para Trio com piano, do mesmo Schubert, uma peça inicialmente pensada para o segundo andamento do Trio com piano n.º 1 e que acabou por ser recomposta e assumir uma faceta completamente nova. Ficou o Notturno - ou “Adagio”, para alguns - “pendurado”, mas não esquecido, a ponto de ser oferecido ao público num extraordinário “encore”. Beethoven dizia que as peças de Schubert o faziam sentir-se no paraíso, e foi um vislumbre do paraíso que Burmester, Meireles e Quaresma ofereceram aos presentes, com uma peça emotiva, rica em matizes sonoros, de uma grande harmonia e que, verdadeiramente, nos fez ver aquilo que somos. Franz Schubert morreu a 19 de Novembro de 1828, em Viena, com 31 anos de idade. Está sepultado no cemitério de Währinger, muito próximo de Ludwig van Beethoven, compositor que venerou em vida. No seu epitáfio, escrito pelo poeta Franz Grillparzer, podemos ler: “A arte da música enterrou aqui grandes riquezas, e esperanças ainda maiores”.

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