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sexta-feira, 9 de maio de 2025

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Curar Feridas” | Xacobe Meléndrez Fassbender



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Curar Feridas”,
de Xacobe Meléndrez Fassbender
iNstantes – Festival Internacional de Fotografia de Avintes 2025
Centro de Reabilitação do Norte
02 Mai > 31 Maio 2025


O Verão desse “annus horribilis” de 2020 caminhava para o final. Os números da pandemia escalavam pelo mundo, mas Portugal, “aluno bem comportado”, não sentia tão intensamente os efeitos devastadores da COVID-19, como sucedia em Espanha ou em França, na Grécia ou em Itália. Passáramos do estado de emergência para o de calamidade, e deste para o de alerta. O uso da máscara e o distanciamento social vigoravam ainda, mas havia liberdade para sair de casa e circular. Destes momentos preservo na memória as coisas simples, quando fotografava sem me afastar de casa. Levantamento minucioso de uma nesga de floresta, de um simples muro, de um pequeno jardim, cada série fotográfica era a descoberta de novos mundos, novas paisagens, aos quais dava novas interpretações, novos sentidos. Cada saída era um momento de apaziguamento, de catarse, um exercício curativo da alma, que sabia bem e fazia bem. Por esse motivo, foi de sobressalto o primeiro olhar sobre “Curar Feridas”, de tão vivas as imagens entraram por mim adentro, tão próximas, tão “minhas” na sua importância, significado e alcance.

Arcando consigo recordações boas e más enrodilhadas num mesmo novelo, “Curar Feridas” é uma exposição do fotógrafo galego Xacobe Meléndrez Fassbender, patente por estes dias no Centro de Reabilitação do Norte, no âmbito do iNstantes – Festival Internacional de Fotografia de Avintes 2025. Nas fotografias que a compõem, percebemos um conjunto de metáforas e aforismos visuais directamente ligados aos tempos da pandemia, os quais permanecem acesos nas nossas vidas, como uma ferida que tarda em sarar. São imagens que “procuram situar-se no momento que impulsiona uma mudança de enquadramentos, nas fronteiras, nos limites do contacto-divisão que se estabelece pela tensão narrativa que dá vida e razão”. Olhá-las é olhar para dentro de nós através da mediação de objectos, luzes, situações, encontrados ao acaso ou avidamente procurados, num processo de observação crítica do espaço em volta e do lugar que ocupamos. A dúvida, essa, permanece viva: O que é que aprendemos com a pandemia?

Entre a razão e a emoção, Xacobe Meléndrez Fassbender fala-nos do valor das coisas banais, da importância de lhes prestamos mais atenção, de nelas podermos demorar o olhar e descobrir-lhes o poder de convocarem emoções. Ao mesmo tempo, desafia-nos a encontrar o nunca antes visto, num jogo de associações que dirá muito mais sobre nós do que sobre os objectos da nossa observação. A debilidade que reside numa planta seca, a “sutura” num balde, a higienização das mãos numa bacia de esmalte, a distância de segurança entre os fungos que cobrem uma pedra, as coordenadas de sombra de uma velha esteira desenhadas na areia, a violência que se abriga no acto de sacar uma rolha, são apenas alguns exemplos de imagens construídas com recurso à memória, a partir dos pequenos nadas de que a vida é feita. Elas são, nas palavras do artista, “círculos que partem do íntimo e transcendem o próprio conflito na relação com os outros e na identidade social, na identidade natural, na procura de esferas cosmogónicas”. Até 31 de Maio, a não perder!

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