EXPOSIÇÃO: “Vozes da Fábrica – Vista Alegre e as Suas Gentes”
Curadoria | Margarida Campolargo, Pedro Rocha
Fábrica e Museu da Vista Alegre
04 Jul > 31 Dez 2024
“Já ali viveram, a par, os avós e os pais tanto de uns como de outros.
Todos se conhecem, é tudo uma família. Há o verdadeiro respeito pelos senhores da Fábrica,
Mas há também, da parte destes, o tradicional capricho de considerar afectuosamente
Todos os seus operários como companheiros, seus amigos, seus leais colaboradores.
A vida da povoação gravita em volta da vida industrial da fábrica.
Todos têm interesses nos resultados da laboração, todos se ocupam do que ali se passa.”
João Teodoro F. Pinto Basto, Livro do Centenário, 1924
Fundada em 1824, a Fábrica de Porcelana da Vista Alegre foi a primeira unidade industrial dedicada à produção da porcelana em Portugal. Para a fundação e sucesso deste arriscado empreendimento industrial foi determinante o espírito de persistência do seu fundador, José Ferreira Pinto Basto. Figura de destaque na sociedade portuguesa do século XIX, proprietário agrícola, comerciante audaz, incorporou sabiamente o ideário liberal do século, tendo-se tornado “o primeiro exemplo de livre iniciativa” em Portugal. Dos primeiros períodos de laboração, com a produção do vidro e cerâmica "pó de pedra" face ao desconhecimento da composição da pasta de porcelana até aos dias de hoje, a história da Vista Alegre faz-se de persistência, engenho, criatividade e algum sofrimento, mas sobretudo do saber-fazer dos operários e de um genuíno apego às tradições centenárias da empresa. São eles que fazem da Fábrica aquilo que ela é hoje, cotando-se entre as grandes manufacturas europeias.
Lugar social e de memória, a mostra leva o visitante à descoberta da Vista Alegre pelas vozes de quatro personagens colectivas, representativas da família Pinto Basto e das famílias operárias do Bairro. São elas que, no decurso do século XX, nos conduzem aos lugares mais íntimos da família, do trabalho, das festas e do bairro operário. Através de histórias da vida quotidiana, que misturam racionalidade empresarial e humanismo, partilham-se as dificuldades e esperanças da vida, o sentimento de pertença e a vontade de mudar. De um lado encontraremos José Ferreira Pinto Basto e o seu desejo de “proporcionar a todos roupa, educação, alimentação e casa”. Do outro, operárias e operários falam das suas conquistas ou permitem-se desabafar, contando histórias sombrias ou de final feliz. No Refeitório ou na Cooperativa, na Barbearia, na Sede do Futebol ou na Fonte dos Amores, as suas memórias dão nota de uma comunidade trabalhadora que rapidamente se converteu numa enorme família. Ao longo dos séculos.
Baseado no pressuposto de que a melhoria das condições de vida dos trabalhadores se traduziria numa maior produtividade da empresa, o fundador pôs em marcha um projecto revolucionário. Tendo a fábrica como cerne do complexo industrial, uma micro-cidade foi nascendo e crescendo à sua volta, com uma oferta à comunidade de trabalhadores que, além da habitação, oferecia infantário e escola para as crianças, uma cooperativa agrícola onde podiam adquirir os produtos a preços mais acessíveis, serviços de primeiros-socorros e de assistência médica, barbeiro, quiosque e um corpo de bombeiros (criado a 1 de Outubro de 1880, é o mais antigo corpo privativo do país); mas também um teatro, uma banda filarmónica, uma capela e uma equipa de futebol. É disto que os painéis que compõem a exposição nos falam, da creche criada em 1926 ao cinematógrafo surgido no mesmo ano, de “O Galego Lorpa”, a primeira peça representada no teatro da Vista Alegre, ao desafio do Vista Alegre com o Operário, cuja receita se destinou “em benefício do jogador Arménio, que, devido a um desastre se encontra impossibilitado de trabalhar”.
Sem comentários:
Enviar um comentário