CINEMA: “Revolução (Sem) Sangue”
Realização | Rui Pedro Sousa
Argumento | Amp Rodriguez, Rui Pedro Sousa
Fotografia | Pedro Negrão
Montagem | Ana Barbosa
Interpretação | Helena Caldeira, Rui Pedro Silva, Dinarte de Freitas, Lucas Dutra, Luís Simões, Bruno Miguel Vieira, Rui Pedro Sousa, São José Correia, Rafael Paes, João Pedro Vaz, Filipe Homem Fonseca, Paloma Del Pillar, Jorge Mota, Luís Lucas
Produção | Nuno Rocha, Roberto Santos, Victor Santos, Rui Pedro Sousa
Portugal | 2024 | Biografia, Drama, História | 103 Minutos | Maiores de 12 anos
Shortcutz Ovar Sessão #81
Centro de Artes de Ovar
11 Abr 2024 | qui | 21:30
25 de Abril de 1974. A noite cai sobre um país libertado, após 48 anos de fascismo, repressão e ditadura. Ao final da tarde desse dia histórico, Marcelo Caetano entrega o poder ao Movimento das Forças Armadas na figura do General António de Spínola e a revolução prossegue sem sangue. Os cravos continuam a florir na boca das armas dos soldados e o povo manifesta-se de forma espontânea e livre. “Eu não tenho palavras. Pela primeira vez na minha vida como repórter de rádio estou a ouvir as pessoas a falar a sério… sem peias”, diria Adelino Gomes aos microfones da Rádio Renascença. Mas a noite traria com ela os mortos de Abril. Na Rua António Maria Cardoso, em frente à sede da Direcção Geral de Segurança, o vermelho não seria o dos cravos, mas o do sangue. São oito e dez quando, da porta da sacada de um primeiro andar, várias rajadas de metralhadora são disparadas sobre os populares que clamam “morte à PIDE, assassinos”. Da debandada geral sobram quatro corpos caídos por terra: Fernando Carvalho Giesteira, Fernando Luís Barreiros dos Reis, João Guilherme Rego Arruda e José James Harteley Barneto. A eles juntar-se-á, duas horas mais tarde, António Lage, 32 anos, servente da PIDE/DGS, uma espécie de “moço de recados” que sucumbiu às balas dos militares revolucionários cerca das 21h20, já depois de se ter entregado.
Primeira longa-metragem de Rui Pedro Sousa, “Revolução (Sem) Sangue” baseia-se em factos reais e procura recuperar uma face menos conhecida do 25 de Abril, concorrendo para o seu reconhecimento e divulgação. A investigação assentou na recolha de informações dadas por familiares, intervenientes do 25 de Abril de 1974, historiadores e jornalistas. No retrato das cinco vítimas, a produção contou com o apoio e o consentimento da maioria das famílias, excepto dos herdeiros de José Barneto, por falta de consenso entre familiares, o que acaba por diminuir o filme no seu grande propósito de narrar a totalidade dos acontecimentos. Saúde-se a bondade da iniciativa, a sinceridade do filme, o empenho de uma vasta equipa em levar por diante o projecto, o aturado trabalho ao longo de mais de três anos e o produto final naquilo que tem de histórico e documental. A cronologia dos factos abrange um arco temporal de cerca de uma semana, mas é no dia da Revolução que o filme se foca, em particular no espaço e no tempo destas que foram as últimas vítimas da PIDE. A Rui Pedro Sousa e à sua equipa ninguém pode negar o mérito de colocar em evidência factos, à sua medida, relevantes e de contribuir para que a memória nunca se apague.
Numa iniciativa com a chancela Shortcutz Ovar e o apoio do Município de Ovar, a sessão especial de apresentação, em dia de estreia nacional, decorreu no Centro de Artes de Ovar e contou com a presença de vários elementos ligados ao filme, entre produtores, argumentistas, actores e realizador. O início da sessão ficou marcado por um momento muito bonito em que Paloma del Pillar interpretou a “Pedra Filosofal”. Quanto a “Revolução (Sem) Sangue”, enquanto objecto fílmico, é decepcionante. O belíssimo trabalho de investigação e de direcção de arte, ao qual se deve acrescentar a escolha criteriosa da banda sonora, colidem com a falta de solidez do argumento, uma qualidade de som medíocre e uma realização pouco segura. A nota de desconcerto é dada por actores incapazes de se libertarem dos tiques telenovelescos, poucos figurantes e mal dirigidos, palavras de ordem gritadas da boca dos manifestantes que não correspondem ao que se escuta no filme. Não se perde a possibilidade de um contra-picado, de um grande plano sobre uma lágrima a rolar pela face, de uma queda em câmara lenta ou de uma canção entoada no momento da despedida. Tudo puxa ao sentimento e, paradoxalmente, a emoção é nula. Um filme que acrescenta história à História, mas que desilude na sua dimensão artística.
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