CINEMA: “Folhas Caídas” / “Kuolleet lehdet”
Realização | Aki Kaurismäki
Argumento | Aki Kaurismäki
Fotografia | Timo Salminen
Montagem | Samu Heikkilä
Interpretação | Alma Pöysti, Jussi Vatanen, Alina Tomnikov, Martti Suosalo, Janne Hyytiäinen, Sakari Kuosmanen, Maria Heiskanen, Nuppu Koivu, Sherwan Haji, Eeero Ritala, Paula Olinonen, Matti Onnismaa, Lauri Untamo, Mikko Mykkänen, Anna Karjalainen
Produção | Aki Kaurismäki
Alemanha, Finlândia | 2023 | Comédia, Drama | 81 Minutos | Maiores de 12 Anos
Vida Ovar
12 Jan 2024 | sex | 19:45
Aki Kaurismäki não pára de nos surpreender. Com uma carreira longa de quarenta anos, continua a ser capaz de oferecer sempre algo de novo, mantendo vivas as constantes que, ao longo dos anos, firmaram a grandeza do seu cinema. “Folhas Caídas” é disso o melhor exemplo, uma longa-metragem sonhadora e desencantada, realista e surrealista ao mesmo tempo, que abraçamos com ternura, que sabe bem e faz bem. A história é simples: Um homem e uma mulher vivem nos arredores de Helsínquia. São duas almas solitárias destinadas a vaguear durante muito tempo até se encontrarem. Estão ambos desempregados - depois de experiências profissionais traumatizantes - e conhecem-se por acaso numa discoteca durante uma noitada de karaoke. É amor à primeira vista, mas o namoro tem dificuldade em arrancar devido a um conjunto de circunstâncias inesperadas e desfavoráveis. Quão longo será o caminho para a felicidade?
Em “Folhas Caídas”, a história dos dois protagonistas parece pertencer a um contexto intemporal. Ou, melhor ainda, a um contexto em que o tempo parece ter parado (momentaneamente?). Isso nota-se de imediato, não só pelos cenários e pelo mobiliário despido e bastante datado dos locais frequentados pelos dois protagonistas, mas também - e sobretudo - pela ausência (quase) total de tecnologia e pela utilização esporádica de computadores apenas num ponto de Internet. E, no entanto, a partir de rádios antigos, o que nos é dito remete claramente para os dias de hoje: a Rússia continua a atacar a Ucrânia, milhares de famílias perderam os seus entes queridos e os seus bens para sempre. Por outro lado, se os arredores de Helsínquia, com os seus numerosos estaleiros, as suas casas decrépitas e as suas pequenas salas de cinema suburbanas onde são exibidos grandes clássicos do passado, nos fazem sentir a atmosfera nostálgica de tempos idos, a grande metrópole está, na verdade, muito mais perto do que parece.
Não falta em “Folhas Caídas” o lado irónico que caracteriza o cinema de Kaurismäki. As composições de imagem rigorosas, os planos predominantemente estáticos e uma fotografia de cores claras e saturadas, oferecem ao conjunto um carácter grotesco e surrealista. Ao mesmo tempo, o filme encerra uma crítica social crua, apontando o dedo ao mundo do trabalho, no qual o ser humano parece já não ser considerado como tal. A alusão a temas como a transitoriedade da vida diz-nos que este é um mundo em que basta um leve bater de asas de uma borboleta para que tudo mude de um instante para o outro. Neste sentido, os protagonistas são, como o título do filme parece indicar, duas folhas caídas da árvore e à mercê do vento, a menos que uma espécie de deus ex-machina chegue para baralhar as cartas e tornar a dar. É assim que o Cinema entra em cena - homem e mulher passam a sua primeira noite juntos num pequeno cinema dos subúrbios -, numa homenagem sincera e sentida de Kaurismäki à sua amada sétima arte, que tão bem tem sabido honrar durante a sua longa e respeitável carreira.
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