Ansião, Figueiró dos Vinhos e Proença a Nova uniram esforços e puseram de pé o projecto ESPORO Disseminação Cultural e Artística que visa a conservação, protecção, promoção e desenvolvimento dos patrimónios naturais e culturais destes municípios. Financiado por fundos da União Europeia, o ESPORO assume-se, de acordo com os seus promotores, “como uma semente que ambiciona a criação de novos olhares e percursos sobre o território, na relação da arte com a natureza e de ambas com a comunidade”. Alavanca para a (re)descoberta destes territórios, novo referente para esta vasta região que toca os distritos de Leiria e Castelo Branco, o ESPORO arrancou oficialmente no início do ano e teve, no fim de semana de 15 a 17 de Julho, um dos seus pontos mais altos, com a apresentação da Rota ESPORO e a revelação dos resultados do desafio lançado a um grupo de artistas plásticos e visuais que deixaram, mediante abordagens conceptuais e estéticas muito diversas, os seus olhares sobre os vastos espaços do Pinhal Interior.
±MaisMenos±, Bosoletti, Colectivo Til, João Louro, Maria Ana Vasco Costa, Mariana Vasconcelos, NeSpoon, Pedro Gramaxo, Rui Gaiola, Ruído, Sawu e Tiago Francez são os responsáveis por um conjunto de doze intervenções / instalações “site specific”, em diversos formatos, medidas e temporalidades, que se estendem por múltiplos lugares, das Fragas de São Simão à Foz de Alge, dos Moinhos do Outeiro à Mata Municipal de Ansião ou do Miradouro das Corgas à Ribeira do Vale d’Água. O visitante interessado em apreciar todas as propostas artísticas deve prever um mínimo de dois dias para o fazer, contando que a distância que separa os dois pontos mais afastados da rota ronda a centena de quilómetros e são muitos os desvios a fazer para uma visita aos locais. Adiantando, desde já, que resumi a minha experiência pessoal a quatro pontos da rota, o mínimo que posso dizer é que a experiência se revelou extraordinária, não só pela qualidade intrínseca das peças visitadas como, sobretudo, pela forma como dialogam com o espaço envolvente e obrigam a uma reflexão sobre um conjunto de questões que estão na ordem do dia.
Colina verdejante à sombra da qual se abriga Figueiró dos Vinhos, o Cabeço do Peão acolhe “SEME”, do artista argentino Bosoletti. Conhecido dos figueiroenses pelos extraordinários murais que cobrem duas paredes na Travessa da Cadeia, bem no coração da vila, Bosoletti virou-se desta vez para a floresta como um todo, provida de “uma grande alma, silenciosa e imóvel”, onde “devemos entrar com ponderação, audição, como num santuário”. Apesar de tudo abrigar, de tudo escutar, de conservar todos os silêncios, a floresta é um espaço profundamente indefeso, vulnerável à acção do homem, aos seus desmandos, à sua mão criminosa. Percebendo isto, não podemos deixar de ver nas três pinturas em madeira que compõe a instalação de Bosoletti uma representação de nós próprios e da nossa impossibilidade em escapar ao sofrimento que nos é infligido. Na linha do fogo que avança num rugido ensurdecedor e semeia a devastação, como reagiríamos na nossa imobilidade de árvores? Quão dilacerantes seriam os nossos gritos? Perante a morte iminente, qual a dimensão da nossa dor?
Ainda no concelho de Figueiró dos Vinhos é possível visitar duas outras propostas, a primeira das quais bem no centro da vila, ocupando a fachada de um prédio da Rua Dr. José Martinho Simões. Trata-se de “Perspectivas” e é uma exposição de fotografia de Rui Gaiola, autor de uma intervenção do mesmo género num prédio na Covilhã. Resultado de um extenso registo fotográfico realizado durante praticamente um ano, a mostra surge condensada em cinco imagens de grandes dimensões que oferecem uma perspectivas de conjunto sobre este território mais alargado do Pinhal Interior. Num lavadouro público da pequena aldeia de Foz de Alge, Tiago Francez propõe-nos “ExHumus I”, peça através da qual o artista assume a Ribeira de Alge como a coluna vertebral da região e nos diz até que ponto as estruturas se deterioram até à sua completa desagregação. A última peça de que falo encontra-se no vizinho concelho de Ansião, na localidade de Casal Soeiro, em pleno Caminho de Fátima e Caminho de Santiago, que aqui coincidem. Chamada “Capela”, é uma instalação de grandes dimensões, da autoria da polaca Nespoon, a partir de rendas tecidas por rendeiras portuguesas. Com ela, a artista permite transmitir inspiração e serenidade aos milhares de peregrinos que atravessam o trilho, contribuindo para uma momento de alívio do seu esforço e de reflexão sobre a beleza da vida.
[Saiba mais sobre o ESPORO Disseminação Cultural e Artística em https://www.esporocultura.com/]
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