CINEMA: “Alcarràs”
Realização | Carla Simón
Argumento | Carla Simón, Arnau Vilaró
Fotografia | Daniela Cajías
Montagem | Anna Pfaff
Interpretação | Jordi Pujol Dolcet, Anna Otin, Xènia Roset, Albert Bosch, Ainet Jounou, Josep Abad, Montse Oró, Carles Cabós, Joel Rovira, Isaac Rovira, Berta Pisó, Antonia Castells, Djibril Casse, Jacob Diarte, Oumar Balde, Alhousseyhou Diallo, Abril Baltrons
Produção | Tono Folguera, Sergi Moreno, Stefan Schmitz, María Zamora
Espanha, Itália | 2022 | Drama | 120 Minutos | Maiores de 12
Cinema Vida
15 Jul 2022 | sex | 18h15
Segunda longa-metragem de ficção de Carla Simón, depois de “Verão de 1993”, “Alcarràs” chega-nos com a chancela de Melhor Filme do último Festival de Cinema de Berlim e o respectivo Urso de Ouro. Um prémio inteiramente merecido, não apenas por aquilo que a realizadora nos vem contar mas, sobretudo, pela forma como o faz, estabelecendo com o espectador uma forte ligação, empática, cúmplice, solidária. O Verão volta a ser o período de tempo em que esta história é ambientada, feito de muito sol e calor, de carros que apodrecem nas imediações das casas, de banhos de mangueira ou mergulhos na piscina sem o cuidado excessivo dos pais de hoje, de fruta roubada às escondidas, faustosos piqueniques e um céu coberto de milhões e milhões de estrelas. Mas também do trabalho árduo na apanha da fruta, das pragas de coelhos, da grande especulação que asfixia os agricultores e, no caso concreto, de uma ameaça de despejo em nome das energias renováveis e do combate às alterações climáticas.
Retrato impiedoso da sociedade actual e da forma como os valores se invertem a cada dia que passa, “Alcarràs” leva-nos a conhecer a aparente simplicidade da vida do campo, ao encontro de uma família que parece isolada do progresso, com um viver ancorado num passado onde os compromissos se honravam sobre a palavra dada. A realidade do presente, porém, é outra, passando por cada um deles como um rolo compressor. É face ao desmoronar de toda uma vida que os vínculos que unem a família e se repetem de geração em geração sofrem o maior abalo. Só as crianças, na sua inocência, com as suas brincadeiras e o seu mundo de fantasia, parecem imunes a esta irrevogável desagregação, apontando novos caminhos e oferecendo aos mais velhos o pretexto de que necvessitam para não desistirem de lutar por aquilo em que acreditam.
Verdadeira prova de amor de Carla Simón pela sua terra, “Alcarrás” tem um lado realista extraordinariamente vincado, nele residindo a sua maior força. Bastam duas ou três sequências iniciais para que o espectador se sinta parte de um quotidiano quase idílico, mas sobre o qual pesa uma tão grande ameaça. É do lado da família que absorvemos as histórias que moldaram aquela casa, as terras em volta e tudo o que nela nasce e se desenvolve. É com Quimet e Dolors, Rogélio e Nati, Mariona e Roger, e com os pequenos Iris, Pere e Pau – quase todos eles actores que fazem aqui a sua estreia à frente da câmera –, que nos sentimos irmanados nessa extraordinária nobreza que é apanágio das pessoas do campo, mas também nos seus medos e preocupações. Hino à terra e aos valores mais tradicionais, libelo de denúncia daqueles que vivem de e para o lucro imediato, “Alcarràs” é um filme extraordinário em todos os aspectos. Um filme que sabe honrar a história e a memória.
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