Páginas

quinta-feira, 24 de setembro de 2020

CINEMA: "Honeyland: A Terra do Mel"



CINEMA: “Honeyland: A Terra do Mel” / “Honeyland”
Realização | Tamara Kotevska, Ljubomir Stefanov
Argumento | Tamara Kotevska, Ljubomir Stefanov
Fotografia | Fejmi Daut, Samir Ljuma
Montagem | Atanas Georgiev
Interpretação | Hatidze Muratova, Nazife Muratova, Hussein Sam, Ljutvie Sam
Produção | Atanas Georgiev, Ljubomir Stefanov
Macedónia | 2019 | Documentário, Drama | 89 Minutos | Maiores de 12
Cinema Dolce Espaço
24 Set 2020 | qui | 18:15


Sob os signos da humanidade, ecologia, tradição e esperança, “A Terra do Mel” é um dos mais belos filmes que nos é dado a ver neste ano tão atípico. Com mais silêncios que diálogos, um olhar objectivo que não se esquece de revelar a sua empatia com aquilo que observa, o filme apresenta-nos a vida de Hatidze, a última mulher do seu clã, obrigada a permanecer solteira para cuidar dos pais e que encontrou na tarefa de apicultora um desafio para seguir em frente com a sua vida. Neste documentário, Tamara Kotevska e Ljubomir Stefanov convidando-nos a seguir esta mulher ao encontro das colmeias, a vê-la a colher o precioso mel, a escutar a natureza e esse permanente zumbido das abelhas, a fruir a paisagem agreste, para depois regressarmos com ela a casa para tratar da mãe, antes de prosseguir até à cidade onde procurará vender o fruto do seu trabalho. É lá que seremos surpreendidos por esse seu gesto de comprar tinta para o cabelo – um cabelo quase sempre escondido por debaixo do lenço – e que é a prova provada da não cedência ao abandono, da não rendição à depressão.

Se levarmos em conta apenas esta parte da história, quase diria que “Honeyland: A Terra do Mel” já cumpriria o seu objectivo de nos dar a ver o desgaste que o confinamento físico e mental pode produzir nos cuidadores ao longo de anos e anos de sacrifício. Mas há um elemento adicional que é introduzido na história e que irá permitir uma série de novas leituras. Chegado o bom tempo, uma família nómada acampa ao lado da casa da mulher. Com ela vêm toda uma série de elementos contrastantes, passando-se da calma e do silêncio ao alvoroço das crianças, ao urrar do gado, à gritaria dos adultos. Os realizadores souberam seleccionar as melhores sequências para nos dar a ver esta dualidade: da família conheceremos os problemas económicos, a dificuldade da convivência e uma série de expedientes que os ajudam a seguir em frente; da mulher, comprovaremos que a sua bondade não tem limites e apreciaremos a vitalidade e o arrebatamento na forma como se aproxima dos mais novos, entregando-se a eles como se fossem seus filhos.

Primeiro filme a ser nomeado, em simultâneo, para os Óscares de Melhor Documentário e Melhor Filme em Língua Estrangeira e grande vencedor do Festival de Sundance, “A Terra do Mel” permite-nos reconhecer em Hatidze uma mulher que se mostra por inteiro, desejosa de partilhar o riso, uma mulher que é o oposto daquela que adivinhamos encerrada no interior das quatro paredes da cela em que se converteu a sua casa meio arruinada. Uma mulher que, por vontade própria, se firmou na dolorosa tradição e que não se cansa de repetir os passos que fizeram de si aquilo que é, mas que o faz sem lamentos, o rosto revelando sempre um inocente sorriso. Sem amargura, sem raiva. Apenas bondade e ternura. É assim que as imagens a devolvem, revelando ao espectador a nobreza e a coragem de quem consegue conviver com os desaires e a frustração, sem esperar grandes mudanças. Uma história comovente, alicerçada no real, muito distante da voragem da grande cidade e, não obstante, tão próxima do quotidiano adverso que cada um de nós pode experimentar.

Sem comentários:

Enviar um comentário