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EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “O Fumo
dos Dias”,
de Luís Carvalhido
iNstantes 2019 - Festival Internacional de Fotografia de Avintes
iNstantes 2019 - Festival Internacional de Fotografia de Avintes
Casa da Cultura Francisco Marques
Rodrigues Junior
01 Fev > 03 Mar 2019
“Sabe? Perguntaram-me os olhos negros
abertos, mais que a boca semicerrada. Eu sei viver sem comer, como
não sei contar os dias, também não sei as refeições que não
como. Acrescentou: não sei é viver sem o calor do fogo, pois
acredito que morro, se não tiver o lume a aquecer-me. Calo-me sem
saber o que dizer. Invade-me o silencioso crepitar da fogueira. Por
momentos não vejo nada, não sinto nada. Corpos disformes na moldura
triste do fumo, vagueiam num contraluz sem nexo. O cheiro… os
cheiros da lenha verde e húmida e as fagulhas mortiças do eucalipto
são o único movimento de verdade dentro deste contentor negro,
ferrugento e de fundo lamacento…”
Luís Carvalhido, in “O Fumo dos
Dias”
Revestindo-se, no essencial, de um
carácter pejorativo, a palavra “cigano” provém do grego
“atsinganos” e designa, originalmente, um povo nómada de baixa
reputação. Ainda que controversa, a palavra tem um significado
preciso e permite objectivar estas comunidades que, no seu conjunto,
englobam cerca de dez milhões de indivíduos. Com algumas excepções,
as suas condições de vida situam-se muito abaixo daquilo que são
as condições médias nos países onde se encontram. Segregados,
discriminados no trabalho e no sistema escolar, eles representam um
verdadeiro desafio para aqueles que, lutando contra o preconceito e a
intolerância, procuram encontrar soluções que promovam a sua
inserção social sem pôr em causa a identidade étnica e cultural
destas minorias.
Quando partiu ao encontro dos ciganos
de Fornelos, no concelho de Barcelos, Luís Carvalhido
não tinha em mente qualquer abordagem sociológica ou antropológica
ao fenómeno. A motivação inicial do projecto era puramente estética, assente
na sua paixão pela fotografia. A verdade é que acabou, fatalmente,
por se ver envolvido na “questão cigana” ao manter, ao longo de
oito meses, uma relação de proximidade, quase de cumplicidade, com
uma comunidade que nem sempre o recebeu da melhor forma. A sua enorme
persistência e sensibilidade acabou por ter como resultado “O Fumo
dos Dias”, trabalho que ultrapassa em muito a fronteira da
fotografia, oferecendo um retrato cru de um quotidiano que rechaça
estereótipos, olhando de frente a realidade chocante de seres
humanos que vivem em condições degradantes e de enorme privação,
imersos num clima de vulnerabilidade e de crescente incerteza e medo
quanto ao seu futuro.
Integrada no iNstantes 2019 - Festival Internacional de Fotografia de Avintes e patente ao público até 03 de Março
numa das salas da Casa da Cultura Francisco Marques Rodrigues Junior, “O Fumo dos Dias” coloca o dedo numa chaga aberta na
nossa sociedade. São imagens que desvendam fronteiras ditadas por
situações sociais e denunciam relações de poder que diferenciam
dominantes e dominados, maiorias e minorias. Com um olhar fundado no
fotojornalismo, Luís Carvalhido furta-se ao convencional e ao
politicamente correcto para abalar consciências e mexer com poderes
instalados. As suas fotografias têm essa força, essa capacidade de questionar o mundo em que vivemos. Vale a pena atentar neste seu trabalho e
descobrir que, mais do que mil palavras, cada imagem vale mil gritos
de indignação e de revolta!
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