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quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

EXPOSIÇÃO DE PINTURA: Roberto Chichorro


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EXPOSIÇÃO DE PINTURA: Roberto Chichorro
Colaboração | Galeria Ap'arte
Museu de Ovar
20 Jan > 30 Mar 2019


Com todas as cautelas, o homem cinzento subiu a íngreme escadaria e virou à esquerda. Como uma onda, a cor atingiu-o em cheio e soube que era ali. “Rua 9”, confirmou, ao mesmo tempo que procurava disfarçar o embaraço por se sentir observado. Debruçada sobre a janela, uma mulher muito jovem e muito bela olhava distraída. A pele chocolate e o cabelo crespo, risco levemente ao lado a dividir a cabeça em dois hemisférios incertos, denunciavam-lhe a origem. “Moçambique, Lourenço Marques, Bairro da Mafalala”, pensou o homem, de Google Maps aberto na mente, a particular geografia a detalhar-se num zoom instantâneo. Viu-se a perder o pé nos olhos amendoados dela, na sua face rosada, na blusa azul tão leve e tão decotada, na promessa de beijos e tudo a dar-se daquela boca vermelha e carnuda. Quis falar-lhe, mas percebeu que a coragem ficara em casa. Fitou-a uma última vez, o olhar a resvalar pelo vaso de flores carmim antes de se estilhaçar na geometria do chão. Retomou o passo e seguiu em frente.

Atraído pelos trinados que se espalhavam no ar em alegres melodias, o homem cinzento dobrou a esquina e quase tropeçou no pequeno “Passarinheiro”, sentado entre sóis e luas, o olhar envergonhado, na mão esquerda uma enorme fisga de cor verde. Na pose adivinhou-lhe a ilusão no arremesso da pedra; no olhar vivo dos pássaros encontrou a certeza de um final feliz. Pareceu-lhe ouvir um “Rodar de pião em telhado de zinco”, mas talvez fosse só impressão. Voltou-se. O som tomava forma. Com redobrada cautela desceu a escadaria íngreme, virou de novo à esquerda e de novo se viu num mergulho de mil cores, de mil tons, de mil amores. Com o coração acelerado, escutou. Era uma “Serenata para beija flor em noite de Arlequim”. Cerrou os olhos, aspirou o aroma da canela e do gengibre que perfumava o ar e teve a certeza que a felicidade morava ali. No mesmo instante, o burro azul e o pássaro verde estremeceram com o clarão. O homem despira o cinzento e tomava as cores do arco-íris. Do interior da gaiola, um peixe acenava.

Patente no Museu do Ovar, com o inestimável contributo da Galeria Ap'arte, a exposição de pintura de Roberto Chichorro tem esta capacidade de nos fazer sonhar. Cada quadro é uma festa de cor, uma carícia na alma, um poema à vida. Cada detalhe, a ponta de um fio desse novelo grande e macio a que chamamos felicidade. A pintura de Chichorro é um convite permanente à brincadeira e ao riso. É um saltar à macaca. É uma corrida de bicicleta. É um bando de miúdos a correr atrás duma bola no areal sem fim da Praia da Catembe. Não vou alongar-me mais, mas arrisco em dizer que estamos perante um dos mais importantes acontecimentos culturais do Concelho de Ovar no ano corrente. Absolutamente a não perder!

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