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sábado, 1 de setembro de 2018

CINEMA: "A Ciambra"



CINEMA: “A Ciambra”
Realização | Jonas Carpignano
Argumento |Jonas Carpignano
Fotografia | Tim Curtin
Montagem |Affonso Gonçalves
Interpretação | Pio Amato, Iolanda Amato, Koudous Seihon, Damiano Amato, Patrizia Amato, Susanna Amato, Rocco Amato
Produção | Paolo Carpignano, Jon Coplon, Christoph Daniel, Gwyn Sannia, Marc Schmidheiny, Rodrigo Teixeira e Ryan Zacarias
Itália, Estados Unidos, França, Alemanha | 2017 | Crime, drama| 118 Minutos | M/14
Cinema Dolce Espaço
01 Set 2018 | sab | 18:30


Contrariando a propensão europeia mainstream de competir com Hollywood em géneros como o thriller ou a comédia, o cinema italiano continua a ensaiar os mais variados modelos de recuperação de alguns dos elementos clássicos do neo-realismo, sem dúvida uma das suas grandes marcas identitárias. Naturalmente, as comunidades locais deixaram de constituir o foco principal destas películas, com os refugiados e os sectores marginalizados a serem os novos protagonistas, neles se condensando o saque do terceiro mundo, ao longo de séculos, pelos europeus  e o momento presente no qual essa mesma Europa parece estar condenada a pagar por aquilo que fez.

Como muitas outras obras que fazem o seu olhar recair sobre as injustiças sociais, a imigração massiva ou a recorrente segregação de grupos específicos por questões étnicas, raciais, religiosas ou culturais, “A Ciambra” inspira-se tanto no referido neo-realismo como no cinema de cunho social britânico, resultando num filme poderoso e impactante. Aqui, o realizador Jonas Carpignano constrói uma espécie de “sequela conceptual” da sua obra de referência, “Mediterranea” (2015), a qual analisava, com um afã documentarista, os processos de expulsão de que são vítimas os africanos e, em concreto, uma viagem desde o continente negro até à Calábria em busca dum futuro melhor, sonho que choca com a violência e intolerância reinantes em Itália.

Em “A Ciambra”, Carpignano retoma a personagem de Ayiva (de novo interpretado pelo genial Koudous Seihon, do Burkina Faso), transformando-a numa figura secundária no interior da história de Pio (Pio Amato), um rapaz cigano de 14 anos que vive no gueto que dá título ao filme, uma comunidade paupérrima da Calábria que olha os italianos com desconfiança – em particular a polícia – e que despreza os imigrantes africanos em geral. Lançado, desde muito cedo, no mundo do crime, Pio mostra que nada há mais importante do que conseguir dinheiro, seja de que maneira for, ao mesmo tempo que se vai afirmando perante a sua comunidade como alguém que já não é uma criança.

Baseando-se numa família real composta por actores não profissionais, o realizador descreve, com a câmera à mão e numerosos primeiros planos, o estilo de vida delinquente de Pio e a sua amizade com Ayiva, agora mais um num acampamento africano que procura escapar à aversão e à miséria. “A Ciambra” adopta a mesma perspectiva – humanista, rigorosa e muito sincera – de “Mediterrânea”, enfatizando a ideia de que há marginalizados dentro dos marginalizados. Carpignano consegue ainda tirar o melhor proveito das qualidades de representação de Pio e da sua família, oferecendo-nos um excelente retrato da cosmovisão cigana do “nós contra o mundo” e a perda dos rasgos nómadas deste povo, no filme representados por um cavalo misterioso e errante…

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