CINEMA: “Maria by
Callas”,
Realização | Tom VolfMontagem | Janice Jones
Interpretação | Maria Callas, Vittorio de Sica, Aristotle Onassis, Pier Paolo Pasolini, Omar Sharif, Luchino Visconti, Fanny Ardant (voz)
Produção | Thierry Bizot, Emmanuel Chain, Gaël Leiblang, Emma Lepers, Tom Volf
França | 2017 | Documentário | M/6 | 113 minutos
Cinema Dolce Espaço, Ovar
12 Mai 2018 | sab | 18:30
“Há duas pessoas em mim, a Maria e a Callas…”. Artista em busca do absoluto, transformada desde muito cedo em ícone à escala planetária, mulher apaixonada e que enfrentou um destino completamente invulgar, Maria Callas mostra-se na primeira pessoa, 40 anos após a sua morte, dando conta duma história de vida verdadeiramente única. Tal como expresso no título, o documentário baseia-se numa Callas a revelar a Maria que nela existe, a figura para lá do estrelato e da fama, pondo a nu as ambiguidades duma personalidade tão apaixonada quanto vulnerável.
Construído a partir de filmes pessoais em Super
8, gravações ao vivo privadas, cartas íntimas e raras imagens de
arquivo a cores, “Maria by Callas” é o resultado dum trabalho de
pesquisa meticuloso e duma montagem particularmente inteligente.
Estamos aqui perante um documentário que encerra um momento de
intimidade com a lenda e com a emoção da sua voz única, naquilo
que constitui uma verdadeira imersão no universo de memórias duma
figura, à época, endeusada, porque completamente inacessível. Para
muitos, este é também o momento de conhecer uma cantora de ópera
ímpar e cuja notoriedade permanece intocável quatro décadas após
o seu desaparecimento.
Aquilo que faz de “Maria by Callas”
um documentário diferente é que não se constrói sobre uma
compilação de imagens de arquivo comentadas por vários
especialistas e outras testemunhas, assentando antes na proposta
ousada de que a única voz audível seja a da própria Maria Callas.
Além dos inevitáveis trechos de concertos (que beneficiam de uma
digitalização que lhes confere uma notável qualidade audio),
a edição de gravações permite reunir um painel
de testemunhos na primeira pessoa totalmente inéditos. Reforçando a
narrativa evocativa da personagem, Tom Volf inclui no documentário
excertos da correspondência pessoal da Callas, à qual Fanny Ardant
empresta a voz. A natureza íntima do conteúdo dessas passagens
epistolares faz com que os sentimentos da cantora sejam revelados na
justa medida da sua gloriosa carreira, e tudo isto com uma enorme
sinceridade à qual ninguém consegue ficar indiferente.
Com
um respeito quase religioso pela Diva, o documentário tece o que é
mais uma conversa privada entre a Callas e o público (suprema ironia!) do que uma lição trivial de História, no sentido
didáctico do termo. Um tal mergulho no mais íntimo da cantora acaba
por constituir uma experiência de cinema que não se destina a ser
endereçada apenas aos seus fãs. Os contornos duma glória merecida
mas agitada, as interrogações face a um público intransigente e,
sobretudo, o relacionamento com os homens – e um em particular!...
-, tudo está feito para que o espectador conheça melhor esta
mulher, sem jamais cair na armadilha do sensacionalismo fácil ou do
voyeurismo indecoroso. Ceda-se ou não ao charme e talento magnético
de Maria Callas, importa reconhecer a este projecto o mérito de
conseguir um delicado equilíbrio entre pudor e intimidade, revelando
com exemplar justeza aquela que foi a maior estrela internacional dos
anos 50 e 60.
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