WORKSHOP DE PINTURA: “Entre a
Síntese e o Detalhe”,
de Rodrigo Costa
Museu de Ovar
21 Abr 2018 | sab | 15:00
Inaugurada no passado dia 14 de
Abril, a exposição de pintura “Entre a Síntese e o Detalhe”,
de Rodrigo Costa, não se esgota nas dezasseis belíssimas
composições patentes ao público no Museu de Ovar e sobre as quais
procurarei pronunciar-me em breve aqui no Blogue. O programa inclui,
ainda, uma conversa com o artista, que terá lugar na tarde do
próximo sábado, dia 28 de Abril, para além dum workshop de pintura
que decorreu na tarde de ontem e que chamou à Sala dos Fundadores do
Museu de Ovar um numeroso grupo de amigos ou simples admiradores do
pintor, para três horas de partilha de experiências, conhecimento e
deleite. Tendo por tema “Medeia”, a tragédia grega de Eurípedes,
e contando com a actriz Aurora Gaia a servir de modelo, o
workshop teve um particular enfoque na parte emocional da pintura
enquanto forma de expressão, na sua vertente essencialmente
subjectiva, acabando por se revelar, desse ponto de vista,
inusitadamente intenso, ao mesmo tempo perturbador e fascinante.
Rodrigo Costa começou por
evidenciar a importância do dramatismo do objecto artístico e a
forma como isso é determinante para o envolvimento do artista com a
sua obra. Pintar é todo um processo profundamente íntimo – toda
uma “paixão”, nas palavras do artista – que tem o seu início
quando se escolhe o tema e cujo desenvolvimento decorre à margem da
vontade consciente. “Tenho de me guiar por aquilo que me vem de
dentro”, confessa o artista, a voz embargada pela emoção. Desde o
esqueleto, traçado a aguarela em pinceladas rápidas e decididas,
até aos detalhes finais, com o pastel a ser a opção para vincar a
força das formas e da cor, Rodrigo Costa mostra o quanto a pintura é
um trabalho complexo, fonte de dor e prazer, ditado pela razão mas, sobretudo, pelo coração. Ainda que suportado
em princípios minimamente concertados, é um processo conduzido por
cada pincelada, um trajecto eminentemente emocional. O público sente isso e mostra-o com um silêncio quase reverencial.
O olhar recai sobre o papel e, paulatinamente, o
desenho vai adquirindo definição. O espectador vê a aguarela fluir e percebe como que uma
espécie de fuga à identificação dos detalhes. A preocupação
deixou de ser o modelo para recair agora sobre a própria identidade
do artista, o seu grafismo. As ideias surgem a uma
velocidade alucinante, são demasiadas as dúvidas para tão
poucas certezas. O pintor angustia-se, debate-se. É fundamental
ouvir-se, escutar-se a si próprio, sentir a cada momento quando é
que pode avançar, como é que pode avançar. E é isso que irá
fazer. As palavras não são mais dirigidas ao público, de quem o
artista se alheou. Recolhido sobre si mesmo, ensaia um solilóquio no
qual se intuem respostas. Os sussurros são audíveis, o sentido das palavras escapa ao entendimento - “dão-me
estas pancadas...”, “ok, ok, óptimo...”, “talvez o diabo
nunca tenha estado num cenário destes...”. O gesto alarga-se. Há
desespero e há fúria. Aquela personagem irrequieta, que reparte o
seu olhar entre a tela e o modelo, que recua dois passos para avaliar
o progresso do seu trabalho, que se afoita na escolha da cor ideal,
do pincel ideal, que se lança sobre a obra para esbater com o dedo uma mancha de tinta ou para soprar o papel libertando-o do pó que o pastel deixou é, afinal,
duas, e não uma pessoa. O Rodrigo Costa racional sabe que não pode
contrariar o Rodrigo Costa emocional e deixa-se ir ao sabor dum apelo
que passou a dominá-lo.
“Não interessa se é ou não é;
se não é, passa a ser”. Entre avanços e recuos, a determinação com que ataca a obra mostra que soube escutar o seu íntimo. Há traços e linhas e
elementos estruturais que deixaram de ser vistos como incómodos
acidentes de percurso e se transformaram em pepitas caídas no sítio
certo e que irão ser preservadas. O trabalho está praticamente
concluído. Agora o cérebro começa a brincar e surgem coisas que já
pouco acrescentam à composição final. Entra-se na fase perigosa,
quando o bom é inimigo do óptimo. “Acho que é isso!”, diz com determinação o artista,
recuando dois passos e baixando lentamente os braços. Com a sala suspensa,
Rodrigo Costa parece saído dum transe quando encara o público. A
voz adquiriu a normalidade. Divide o olhar entre a obra e os
presentes na sala. “Assim, de repente, para que as pessoas percebam
minimamente, acho que a situação está resolvida”, serão as suas
palavras finais. Ainda inquieto, a recuperar da emoção, o público
aplaude com vigor. “Medeia” desce do seu trono e observa aquilo
que é a sua representação. “Que lindo”, exclama, feiticeira
tomada pelo feitiço da forma e da cor. Mas a história não acaba
aqui!...
... Obrigado, Joaquim Margarido, pela presença, pela recolha das imagens, e pelo seu texto objectivo.
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