Orientada por | Professor César Santos Silva
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
Organizada por | Confraria das Almas do Corpo Santo de Massarelos
17 Mar 2017 | sab | 10:00
Em nova iniciativa da Confraria das
Almas do Corpo Santo de Massarelos, decorreu esta manhã uma
Visita Guiada orientada pelo Professor César Santos Silva ao encontro dos pontos que unem a cidade do Porto à figura do Rei Carlos Alberto. Num percurso que ligou a Praça de Carlos Alberto à Capela com
o mesmo nome, nos Jardins do Palácio de Cristal, foi passada em
revista a história do monarca, nascido em Turim, em 02 de Outubro de 1798 e que viria a terminar os
seus dias no Porto, em 28 de Julho de 1849, após um curto exílio de
100 dias.
Afinal, quem foi Carlos Alberto? Como é
que alguém que aqui viveu pouco mais de três meses conseguiu ficar tão intimamente ligado à história e ao património da
cidade? Porque é que “caiu no gôto” dos portuenses? Ao encontro
das respostas a estas e outras questões, o Professor César Santos
Silva começou por relatar os factos históricos que fazem de Carlos
Alberto – Carlo Alberto Emanuele Vittorio Maria Clemente Saverio di Savoia-Carignano, de seu nome completo –, Rei do Piemonte e da Sabóia, um homem na mó de baixo à
sua chegada ao Porto. Tendo aderido às ideias inspiradas por uma
Itália federada e livre dos Habsburgos, Carlos Alberto liderou as
forças que levaram à primeira Guerra da Independência contra o
Império Austro-Húngaro, acabando derrotado em Novara e abdicando do
trono em favor do seu filho, Vittorio Emanuele. Obrigado a fugir do seu país, elege o Porto – cidade que personificava os ideais do
liberalismo - como local de exílio, onde chega em 19 de Abril de
1849.
A sua presença na cidade torna-se num
acontecimento de enorme relevância e o monarca é aclamado quase em histeria pelas multidões que o aguardam. Mas vem cansado,
depois duma viagem ininterrupta de 29 dias, com início em Novara e que irá atravessar, sucessivamente,
Vercelli, Ventimiglia, a francesa Côte d'Azur, Toulouse, Tarbes,
Hendaye, Burgos, Valladolid e, finalmente, Portugal, onde entra pelo
Norte do País. Mais do que cansado, vem doente e “a medicina da
época não tem melhor remédio para lhe oferecer do que leite de cabra”.
Hospedado no Palacete Visconde de Balsemão, na então hospedaria que
pertencia ao espanhol Pexe, na Praça dos Ferradores (actual Praça de Carlos Alberto), podia dizer-se que Carlos Alberto vivia no “inferno”. À azáfama deste
concorrido e ruidoso ponto de partida e chegada dos fluxos de viajantes e carga de e
para o Norte, juntavam-se os sucessivos pedidos das elites para audiências, privando-o do tão necessário
repouso. Daí que, ao cabo de 19 dias, Carlos Alberto se veja
obrigado a encontrar novo poiso, quiçá mais tranquilo.
É ao encontro duma pequena casa na Rua
do Triunfo – actual Rua D. Manuel II – que os participantes na visita guiada se dirigem entretanto. E porque, em história, “tudo tem a ver com
tudo”, pelo caminho vão sendo feitas referências de ordem vária:
ora se “visita” o Hospital de Santo António e o seu projecto de construção megalómano com assinatura do arquitecto inglês John Carr, ora se tecem considerações sobre o Palacete do Visconde de
Vilarinho de S. Romão e a sua capela quinhentista, transformada hoje em bar da noite. Há referências a Abel Salazar - para o Professor César Santos Silva, “o mais
completo homem do seu tempo” -, a Manuel Rosário, tio de Almeida
Garrett e do qual a Rua do Rosário vai herdar o nome, ou ainda a Arthur
Wellesley, o Duque de Wellington (“não confundir com Duke
Ellington”), cuja estátua “é quase o mesmo que erigir uma
estátua a Angela Merkel a agradecer a troika”. E não ficam para trás o Palacete do
Visconde de S. João da Pesqueira, futuro Marquês de Távora (“esse
mesmo, o do Marquês de Pombal e dos azares”), ou o Palácio dos
Carrancas, actual Museu Nacional de Soares dos Reis, depois de
inicialmente proposto para albergar um Hospital de Crianças.
Mas voltemos à Rua do Triunfo e à
casa que Carlos Alberto virá entretanto a ocupar e na qual ficará alojado pouco mais de
um mês. Porquê? Primeiro, porque tem apenas três divisões e se mostra exígua para o monarca e seu séquito; e,
depois, porque a barulheira contínua, graças à chiadeira
dos carros de bois a caminho de Matosinhos, o impede de repousar. É
então que a família Pinto Basto, proprietária da Vista Alegre e
com interesses em Inglaterra – de onde irá importar para o nosso
país, em 1889, essa “excentricidade” chamada Foot-ball –, oferece ao monarca
no exílio a sua quinta de recreio, a Quinta da Macieirinha (actual
Museu Romântico), a troco da módica renda mensal de 600.000 reis. Carlos Alberto acaba por se instalar neste reduto de
tranquilidade nas encostas do Douro, onde virá a falecer, como
dissemos, em 28 de Julho de 1949. A título de curiosidade saiba-se
que todo o mobiliário da Casa, ao tempo de Carlos Alberto, está
agora no Museo Nazionale del Risorgimento Italiano, sediado no
Palazzo Carignano, em Turim, sendo o mobiliário que se pode apreciar
no Museu Romântico uma cópia exacta do original.
Após a morte do monarca, o seu corpo
foi transladado para o Panteão dos Sabóia, em Itália. A sua
meia-irmã, a princesa Frederica Augusta de Montheart, contudo, não
esqueceu a cidade que acolheu Carlos Alberto nos seus últimos tempos
de vida. Deslocando-se ao Porto, em 1854, mandou erigir uma capela em
sua memória nos Jardins do Palácio de Cristal, evocativa de S.
Carlos Borromeu, a qual ficou concluída em 1861 e é hoje local de
culto da Igreja Luterana. Antes disso, em 1852, o Porto oferecia o
nome de Carlos Alberto à Praça dos Ferradores, o qual se mantém (e
manterá) vivo na toponímia da cidade. Fica assim concluída esta
visita guiada de enorme interesse e valor histórico, restando apenas
o conselho para ficarem atentos às iniciativas da Confraria das Almas
do Corpo Santo de Massarelos, a próxima das quais, já no dia 08 de
Abril, orientada pelo Professor Joel Cleto, levará os
participantes num percurso pelas margens de Gaia, na (re)descoberta
da lenda do Rei Ramiro e do castelo de Gaia. A não perder!
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