EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “O Mundo Inteiro é um Palco”,
de William Klein
Curadoria | David Campany
MAAT – Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia
18 Set 2024 > 03 Fev 2025
William Klein (1926–2022) teve uma vida criativa notável, abrangente e singular. Entre a fotografia de rua, a fotografia de moda, a realização de filmes, a pintura e o design gráfico, Klein produziu uma obra verdadeiramente inovadora que mudou profundamente a cultura visual. Nascido em Nova Iorque, estabeleceu-se em Paris após o fim da II Guerra Mundial, mas gozou uma vida internacional, trabalhando nos EUA, Europa, Ásia e África. As primeiras obras que William Klein fez em finais da década de 1940 e inícios de 1950, eram pinturas figurativas com composições gráficas que antecipavam a sua fotografia de rua. Depois, dedicou-se à abstracção. Em 1952, na cidade de Milão, uma exposição de Klein chamou a atenção de um arquitecto que pediu ao artista que adaptasse as suas pinturas à divisória do quarto de um apartamento que seria feita de painéis rotativos. Enquanto Klein fotografava os painéis, a sua mulher Jeanne rodou-os, dando origem a manchas nas fotografias de longa exposição. Fascinado com o efeito, William Klein fechou-se na sua câmara escura e produziu centenas de fotogramas abstractos. Não havia regras. A sua produção de imagens era física. Tudo era possível.
Fosse nas páginas de uma revista, nos seus icónicos livros de fotografia, no ecrã de cinema ou nas paredes dos museus, a sua enorme sede de viver, a curiosidade pelas pessoas e o sentido de humor e diversão informaram tudo o que produziu. Em 1954–1955, nas ruas de Nova Iorque, e mais tarde nas de Roma, Moscovo, Tóquio, Paris, e outras cidades, William Klein nunca fez por ser discreto. Espreitava tudo o que mexia em volta e conversava muito. De uma breve e bem-disposta troca de olhares, podia surgir uma fotografia. Na Vogue, Klein tinha uma ligação forte e espontânea com as várias modelos com quem trabalhava, convidando-as muitas vezes a participar no jogo lúdico de fazer as fotografias. É-nos impossível saber a natureza exata do que se passa entre um fotógrafo e quem está à frente da sua máquina. A imagem dá-nos pistas, mas nunca nos diz tudo. Uma fotografia é como um poema – fragmentária, sugestiva e aberta à interpretação do público. No entanto, podemos dizer que os olhares devolvidos a Klein são sinais de um mundo social rico, complexo e efémero, e de uma profunda curiosidade mútua.
William Klein foi um dos poucos fazedores de imagens com um estilo visual único, definido por composições complexas cheias de energia e exuberância no modo como eram apresentadas. Em 1961 foi convidado a visitar Tóquio e, dias após chegar, já andava a explorar a cidade sozinho. A língua japonesa não foi obstáculo: forçou-o a comunicar através da boa-disposição, da predisposição para a diversão e da aceitação dos absurdos da comunicação. Deparou-se com aulas de caligrafia, cerimónias do chá, casas de gueixas, políticos, armazéns comerciais, uma escola de cabeleireiros, manifestações públicas, e muito mais. Nos últimos dois dias na cidade, fez mais de seiscentas imagens notáveis que retratam a dança moderna que encontrou na rua. Tatsumi Hijikata, Yoshito Ohno e Kazuo Ohno fazem poses que misturam coreografias tradicionais japonesas com aspectos da dança de vanguarda ocidental retirados de imagens de Martha Graham e Jerome Robbins. As suas fotografias de Tóquio deram origem a um livro em 1964, ano em que a cidade acolheu os Jogos Olímpicos.
Apesar de trabalhar no centro do mundo comercial, Klein era um artista com uma independência feroz que nunca deixou de se dedicar aos projectos artísticos que o apaixonavam. “O Mundo Inteiro É um Palco” é uma visão de conjunto da sua vasta obra. Em vez de apresentar uma cronologia, esta exposição mostra como as suas definições de performance e teatralidade deram forma a tudo o que produziu. Vemos como as suas fotografias e filmes surgiram de uma atitude espontânea e improvisada para com a vida. Vemos como quebrou as regras e convenções da arte, da fotografia e do filme documental. Vemos como o seu amor pela abstração se foi infiltrando no seu trabalho figurativo. Alegre, espontâneo, por vezes um pouco tenso, o mundo enquadrado por Klein transmite a ideia de uma peça de teatro improvisada da qual transborda uma energia vital reforçada pela presença dele. As suas composições incrivelmente organizadas estão cheias de vectores tensos e microgestos que puxam o olhar do público em muitas direcções. Em cada caso, Klein foi parte integrante da situação, embora sempre hipervigilante em relação ao potencial do contexto enquanto imagem. Alguém que, ao mesmo tempo, esteve dentro e fora.
[Texto baseado no Guia da Exposição, o qual pode ser lido na íntegra em https://maat.pt/sites/default/files/2024-10/William-Klein_guia-exposicao.pdf]
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