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sexta-feira, 1 de novembro de 2024

LUGARES: Ateliê António Carneiro



LUGARES: Ateliê António Carneiro - Museu do Porto
Rua de António Carneiro, 363 - Porto
Horários | De terça feira a Domingo, das 10h00 às 17h30
Ingressos | Bilhete normal € 4,00


A exposição inaugural do novo Ateliê António Carneiro no Porto, ao Bonfim, com projecto do Arquitecto Camilo Rebelo, depois de muitos anos encerrado, constitui um momento importante do ponto de vista artístico e cultural ao permitir ao público interessado nas artes tomar um renovado contacto com aquele que é um dos maiores pintores portugueses e, decerto, o que melhor ajudou a fazer a passagem do simbolismo finissecular - de que o Tríptico “A Vida” é exemplo maior a nível Europeu - e uma nova abordagem da pintura que, de certo modo, o aproxima dos Nabis e introduz de tal sorte uma nova consciência modernizante que iria influenciar Amadeu de Souza-Cardoso nos seus inícios. Constituída por grandes núcleos temáticos - “A Paisagem”, “A Chave Simbolista”, “A Família” e “Diálogos” - a exposição acolhe ainda uma relação com a contemporaneidade, ao abrir-se a mostrar como que num diálogo largo no tempo, uma série de obras de escultura de Miguel Branco que, por ocasião da inauguração da exposição e do Ateliê oferece uma obra significativa de escultura pública à cidade, ficando a mesma presente no jardim do Ateliê.

No núcleo de “A Paisagem” privilegiaram-se as obras porventura menos conhecidas do Artista realizadas sobre o tema da paisagem e, na sua maioria, inéditas, já que provenientes de Colecções privadas: este permitirá compreender como a obra de Carneiro fez uma evolução sensível, coerente e sem par na Arte Portuguesa, que mostra a sua atenção ao contexto internacional. Uma série de Marinhas e de Nocturnos, de delicado invenção plástica e complexa execução, evidenciam o sentido de dissolução das formas que, sem ter passado pelo modelo Impressionista, outros pintores europeus seus contemporâneos, como Munch ou Hammershoi, igualmente adoptaram, levando a pintura de Carneiro para um inusitado acercamento expressionista. A “Chave Simbolista” ocupa-se com evidenciar como a arte de Carneiro começou por se abrir ao Simbolismo, então ainda muito forte em França, onde estudou e pintou em 1900 o seu famoso e notável Tríptico, mostrando como a lição dos seus mestres (Soares dos Reis na Escola do Porto e Auguste Carrière em Paris) o marcaram, bem como a atenção que deu a obras como a de Puvis de Chavannes ou mesmo a de Rodin, então já plenamente consagrados na arte francesa.

“A Família” reúne algumas das imagens íntimas em que Carneiro retratou a sua família em aproximações sensíveis verdadeiramente fascinantes, tendo deixado alguns dos mais altos momentos do género do Retrato na arte portuguesa. “Os Diálogos”, abrindo-se às relações com alguns dos seus contemporâneos, percepcionam por um lado uma correspondência até hoje pouco esclarecida - com Aurélia de Souza que vivia na Quinta da China, uma propriedade de família nas imediações do Ateliê e cuja pintura em muitos aspectos faz, com a de Carneiro, a ponte para a consciência moderna na Arte Portuguesa - e, por outro, com outros artistas de que igualmente foi contemporâneo, porventura tendo-os influenciado: obras de Artur Loureiro ou de Amadeo e alguns mais, explicitam de que modo a influência de Carneiro foi ganhando espaço e sentido na arte desse período. Finalmente a presença de Miguel Branco com três núcleos escultóricos, procura mostrar como reverbera ainda, na contemporaneidade, um eco simbolista que importa atender no seu significado ético e estético. Deste modo, a exposição procura apontar caminhos futuros para a programação, que poderão servir a estudar no tempo as relações de António Carneiro com o seu tempo, mas também com o futuro da Arte Portuguesa. 

[Texto de Bernardo Pinto de Almeida, Curador]

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