CONCERTO: Carta Branca a Selma Uamusse
Com | Orquestra Geração, Augusto Macedo, Gonçalo Santuns, Nataniel Melo, Nilton Gulli, Active Mess, Ola Mekelburgh, Bárbara Wahnon, Nayr Faquirá, Yery Varela, Yeni Varela, A garota não
Centro Cultural de Belém - Grande Auditório
01 Nov 2024 | sex | 20:00
O Centro Cultural de Belém voltou a preencher o espaço do Grande Auditório com a música, a energia e os ritmos de África. A celebrar uma década de carreira artística, Selma Uamusse aceitou o desafio da criação de um novo, inédito e único espectáculo ao vivo, trazendo para o palco um conjunto alargado de temas dos seus dois álbuns a solo, “Mati” e “Liwoningo”. Mulher, mãe de quatro pequenas mulheres, neta e filha de duas grandes mulheres, Selma Uamusse vincou o lugar da feminilidade nesta carta aberta, celebrando a mulher que é, as mulheres que a geraram, as que admira e as que a inspiram. Foi com elas que subiu ao palco, fazendo das quase duas horas de concerto um tempo de escrita de uma carta a muitas mãos, elegante, jovial, generosa e talentosa. Com elas e com os jovens da singular Orquestra Geração, um projecto social que se foca na inserção social e na capacitação de crianças e jovens, cúmplices na escrita desta carta aberta ao futuro, que deixou de ser branca, mas antes uma paleta de cores, talentos e dons.
Teve o cheiro da liberdade, esta Carta Branca. Numa folha em branco, carregada de sonhos e vontades, Selma Uamusse quis pôs cor e gente, sorrisos e alegria, mas também espaço para respirar, escutar, quiçá chorar. Espaço para as histórias e as memórias, espaço para celebrar o presente, mas também para ter prazer na espera e na esperança do futuro, convicta de que o melhor está ainda por chegar. Daí que não pudesse faltar, nesta noite memorável, a dona de uma voz de maior relevância no panorama actual musical e no que diz respeito à dignidade, ao cuidado com as palavras e ao outro: A garota não. “Cidadania”, uma canção escrita para Selma Uamusse e cantada pelas duas artistas, foi mais um grito contra as injustiças e dores dos que não nascem num seio privilegiado. Convidado a embarcar numa viagem disposta a abraçar novos rumos, visões, canções e acções, o público não se fez rogado. Cantou, pulou, dançou a marrabenta, ensaiou passos tímidos na língua Bantu e, numa sequência de momentos alegres e prazerosos, foi feliz.
Nos 50 anos de democracia em Portugal e, em breve, de 50 anos de independência de Moçambique, esta foi uma carta que celebrou os movimentos de libertação dos países africanos de expressão portuguesa, pintando com as cores de todos eles um novo quadro que não esquece o passado, mas celebra as possibilidades do futuro através da arte, através da música. Sem medo de olhar para trás, Selma Uamusse fez desta carta branca uma carta de amor e comunhão, chamando ao palco o pouco conhecido património cultural moçambicano, as suas línguas, instrumentos tradicionais, ritmos e polifonias, em temas como “Hoyo Hoyo” ou “Hossi Anga”, “Amatuetwetwe” ou “Ngono Utana Vuna Kudima”. Carregadas de paixão, fé e esperança, com a música vieram palavras de paz, palavras de ordem, palavras de amor e de dor, clamores, louvores. Moçambique e Portugal unidos, olhos nos olhos, com o mesmo pulsar no coração através da música, e em palco, celebrando as suas diferentes identidades. Khanimambo, Selma Uamusse.
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