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quarta-feira, 11 de setembro de 2024

CINEMA: "Os Excluídos"



CINEMA: “Os Excluídos” / “The Holdovers”
Realização | Alexander Payne
Argumento | David Hemingson
Fotografia | Eigil Bryld
Montagem | Kevin Tent
Interpretação: Paul Giamatti, Dominic Sessa, Da'Vine Joy Randolph, Carrie Preston, Brady Hepner, Ian Dolley, Jim Kaplan, Michael Provost, Andrew Garman, Naheem Garcia, Stephen Thorne, Gillian Vigman, Tate Donovan, Darby Lee-Stack, Bill Mootos, Dustin Tucker
Produção | Bill Block, David Hemingson, Mark Johnson
Estados Unidos | 2023 | Comédia, Drama | 133 Minutos | Maiores de 12 anos
Cine-Teatro Eduardo Brazão
11 Set 2024 | qua | 15:30


Colégio centenário de enorme prestígio, a Barton Academy é frequentada pelos filhos dos ricos e poderosos da Nova Inglaterra. Num ambiente de sobranceria e presunção, opulência e privilégios, é aqui que os rebentos da classe dominante consolidam a arrogância que os leva a acreditar que podem estar acima de tudo e de todos. É também aqui que o mal-humorado e mal-amado Professor Paul Hunham leciona Civilizações Antigas. Sobre a sua maneira de ser não faltam reparos, desde o Director que lhe pede para “ao menos fingir ser um ser humano” ao estudante que, perante a sua figura hostil e intransigente, diz pensar “que todos os nazis se tinham refugiado na Argentina”. Nada disto, porém, leva Hunham a modificar a sua atitude. É um misantropo e faz questão de continuar a sê-lo. Mas quando as férias de Natal chegam, vê-se obrigado a permanecer no “campus” para acompanhar os poucos alunos residentes ali confinados e que não tiveram a oportunidade de ir passar a quadra com a família.

“Os Excluídos” tinha tudo para se tornar um filme banal, falho de ideias (à semelhança do que vai surgindo com a chancela de Hollywood), feito de clichés de princípio ao fim. Felizmente não é isso que acontece, graças a uma cuidada e sensível realização de Alexander Payne que sabe encontrar o ritmo certo no delicado equilíbrio entre a amargura e o humor negro, mas, também, porque estamos perante um argumento judiciosamente trabalhado por David Hemingson, onde reside a alma do filme. Não sendo perfeito, já que parte da trama denota alguma ansiedade na sua resolução, mostra-se com um toque leve em relação aos momentos mais sombrios, conseguindo fazer com que o contexto de comédia não anule o lado dramático, e vice-versa. E há, ainda, Paul Giamatti, Dominic Sessa e Da'Vine Joy Randolph, três actores de excelência – Da’Vine viria a arrecadar o Óscar para Melhor Actriz Secundária –, os três pilares sobre os quais o enredo assenta, que se mostram preciosos na forma como interagem entre si, trazendo para a história as figuras arquetípicas do pai, da mãe e do filho.

Retrato das grandezas e misérias que sustentam a condição humana, “Os Excluídos” analisa a errância existencial em que as três principais personagens se veem mergulhadas – uma vida social inexistente, um pai ausente, um filho desaparecido –, estendendo a sua atenção às relações de classe e aos privilégios que só o dinheiro pode comprar. Com a Guerra do Vietname em pano de fundo – é marcante a forma como Payne dá a ver que o curso da Guerra não afecta diretamente os alunos privilegiados da Barton Academy, certos de que o dinheiro dos pais os isentará do recrutamento militar –, “Os Excluídos” é um filme que explora o processo auto-destrutivo de uma certa classe liberal de pessoas brancas, apiedada com o destino daqueles que, na escala hierárquica social lhes são inferiores, mas que raramente aceitam que essas pessoas possa ter uma voz. Filmado em película, o que acrescenta ao filme uma granulação natural e reforça a estética dos ambientes de época dos anos 70, eis um filme divertido e comovente ao mesmo tempo, constituindo uma das boas surpresas em mais um Verão do nosso descontentamento.

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