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terça-feira, 7 de maio de 2024

CONCERTO: Cuca Roseta com Orquestra Filarmonia das Beiras



CONCERTO: Cuca Roseta com Orquestra Filarmonia das Beiras
Direcção Musical | Jan Wierzba
Arranjos | Marino de Freitas
Maio do Azulejo 2024
Igreja Matriz de Válega
05 Mai 2024 | dom | 18h00


Ao falarmos da nova geração de fadistas portugueses, há uma mão cheia de nomes que nos acorre de imediato, sendo incontornável, entre eles, mencionar o de Cuca Roseta. Possuidora de uma extraordinária voz, exímia na expressão dos sentimentos de saudade, nostalgia e resignação que são essência do Fado, é com naturalidade que lhe incorpora ritmos e cores mais alegres, inspirados na música de raiz popular portuguesa e em géneros musicais tão diversos como a world music, os blues ou o jazz. Foi esse ecletismo, a qualidade e bom gosto postos no saber fundir tradição com modernidade, que a fadista trouxe para o concerto do passado domingo, no espaço emblemático do nosso património azulejar que é a Igreja Matriz de Válega. Acompanhada pelos músicos Francisco Sales (guitarra clássica), Sandro Costa (guitarra portuguesa), Pity (baixo) e Vicky Marques (bateria) e pela Orquestra Filarmonia das Beiras, sob a direcção do maestro Jan Wierzba, Cuca Roseta cantou e encantou, na sua forma única de saber extrair a emoção das palavras e de transformar a voz em sentimento.

Seleccionados de forma criteriosa, os temas que se foram alinhando ao longo do concerto tiveram o condão de mostrar a variedade, riqueza e versatilidade do Fado. Colocando em confronto “Ai Mouraria” e “Marcha da Mouraria”, os dois temas que abriram o concerto, Cuca Roseta provou que é muito mais o que une as diferentes variações do Fado, do que aquilo que as separa. Se o primeiro tema é melancólico, sentido, lamentoso, feito de “guitarra[s] a soluçar”, já o segundo é mexido e atiradiço, “alegre, boémio, fadista”. Mas o bairrismo, esse, corre da mesma forma nas veias de um e outro, com o mesmo amor e ciúme, o mesmo “mistério de moura encantada”, o mesmo vulto da Severa. Levado pela fadista numa viagem de descoberta, entre um mexer de ombros e as inevitáveis palmas a compasso, o público seguiu num “Finalmente” ao encontro do “Amor Ladrão”, uma “Lágrima” devolveu-lhe a certeza de que “Havemos de ir a Viana” e no “Amor de Domingo” encontrou uma “Estranha Forma de Vida”.

“Canção do Mar” haveria de colocar um ponto final no alinhamento, prolongado num “encore” em dois tempos, o último dos quais, “Rosinha da Serra d’Arga”, firmaria um concerto de grande intensidade e beleza. Mas é do primeiro tema do “encore” que gostaria de falar, um tema que não era suposto ser cantado, mas que em boa hora uma pessoa do público pediu e ao qual, em melhor hora, a fadista acedeu. Cantado “a capella”, “Ave Maria”, de Schubert, foi um momento de intensa espiritualidade, uma homenagem sublime a Maria num espaço onde o culto mariano se exprime de forma vibrante, um abraço a todas as mães naquele que foi o Dia da Mãe. Apenas mais uma nota para o momento de “Guitarrada”, uma superior demonstração de classe e virtuosismo dos quatro músicos que acompanham Cuca Roseta, mas sobretudo a lição que importa reter quanto às potencialidades da canção nacional. Se dúvidas houvesse, a forma como o Fado tendeu para o campo dos Blues, do Clássico ou do Jazz, graças, respectivamente, aos acordes de Francisco Sales, Sandro Costa e Pity, acabaria por dissipá-las.

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