Quando, em 2007, Frazana Wahidy começou a viajar para fora do Afeganistão, percebeu que a imagem das mulheres afegãs se encontrava dominada pelo olhar de fotógrafos estrangeiros. Embora respeitasse e valorizasse muito o trabalho de todos eles, achou desde logo que seria importante mostrar às pessoas a perspetiva feminina de alguém que viveu e sentiu essa realidade, de modo a obter uma compreensão mais profunda do seu país. Foi desta forma que se entregou de alma e coração ao projecto de documentar as mulheres afegãs nas suas vidas quotidianas, mostrando as restrições religiosas a que estão sujeitas e a enorme pressão dos seus costumes e tradições. Casamentos infantis forçados, abuso físico e sexual, risco de assassinato e execução pública, e ainda a proibição do trabalho e educação, são apenas algumas das lutas que as mulheres afegãs enfrentam diariamente e que Farzana Wahidy faz questão de mostrar no seu trabalho.
“Strenght and Spirit: The Resilient Women of Afghanistan”, que podemos apreciar na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, no âmbito dos Encontros da Imagem de Braga, é uma pequenina amostra do poder das imagens desta fotojornalista, apontada pela revista Time, em 2017, como uma das 34 fotógrafas cujo trabalho merece ser seguido de bem perto. À estranheza de vermos um casal, no dia do seu casamento, a posar para a fotografia no interior de um templo em ruínas, ou de uma mulher que avalia os estragos provocados pelo ataque a uma escola, somam-se imagens da luta das mulheres de cara descoberta que carregam um caixão por entre uma barreira de homens que, de forma solidária, estão ali para as proteger, o horror de um corpo coberto de cicatrizes pelas queimaduras de uma tentativa de auto-imolação, a abjecção da mulher violada por um vizinho que é considerada culpada e acaba por dar à luz na prisão ou o indizível da jovem deitada numa cama, olhando o vazio enquanto espera por assistência médica, o rosto sem nariz depois de ter sido cortado pelo marido.
Primeira fotógrafa afegã a trabalhar com agências de comunicação internacionais, tais como a Associated Press e a Agência France Press, Wahidy tem estendido o seu interesse às mulheres afegãs que vivem fora do Afeganistão, e à nova geração de mulheres afegãs, dentro e fora do Afeganistão, que se esforçam por trazer mudanças às suas vidas e lutam por um futuro melhor para si e para as suas filhas. Apontamentos em torno deste novo foco surge-nos na forma da três mulheres que desafiam a proibição de andar de rosto tapado, de uma jovem praticante de artes marciais que persegue o sonho de integrar a equipa olímpica do seu país, de uma mulher que atravessa uma rua empoeirada de Cabul num dia de muito vento, revelando muito mais do que escondendo por debaixo da burca ou de uma mulher que, em trajes tradicionais, dança numa praia muito distante, noutro continente. São imagens contrastantes, cada uma delas com a sua história, todas elas confluindo naquilo a que chamaríamos coragem mas que, para estas mulheres, é apenas o seu quotidiano”. Uma das mais impactantes exposições da presente edição dos Encontros, de visão obrigatória.
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