Após grande parte dos Estados Unidos da América entrar em confinamento no início de Março de 2020, a fotógrafa Maggie Shannon começou a acompanhar o trabalho de um grupo de parteiras em Los Angeles, de súbito a braços com a necessidade de cumprir com os novos protocolos causados pela pandemia Covid-19 e com as disrupções que os mesmos acarretavam na relação destas profissionais de saúde com as suas grávidas e parturientes. Especializada em retrato e trabalho documental, a jovem fotógrafa - nomeada uma das Magnum's 30 com menos de 30 anos - foi ao encontro do que significa suportar a vida num momento de tristeza e dor ao fotografar estas parteiras. Percebeu que os seus telefones não paravam de tocar com chamadas de mulheres aterrorizadas, à espera de dar à luz em segurança nas suas casas. Para estas mulheres essa parecia ser a única opção devido aos hospitais lotados e a muitos deles proibirem parceiros na sala de parto, afigurando-se como mais vantajosa a possibilidade de passar pelo parto sem máscara e num ambiente familiar.
No meio da pandemia, em finais de 2021, Maggie Shannon fez incidir a mesma atenção sobre as parteiras de West Michigan. Muitas das pacientes recusavam-se a ser vacinadas ou a usar máscaras durante as suas consultas, acabando por testar positivo para a Covid-19. Estas profissionais viram-se na linha da frente, literalmente, no que toca à observação de complicações de Covid-19 em mulheres grávidas. Após quase dois anos de pandemia, elas tinham sobre si o peso de um trabalho desgastante e de alto risco, ao qual se somava o problema dos recursos humanos, cada vez mais escassos, sobrecarregando-as e esgotando-as. De cada uma das belíssimas imagens de Maggie Shannon que ocupam uma parte do enorme salão do primeiro piso da Galeria do Paço, ressalta a ideia de que o trabalho das parteiras, até aos dias de hoje, não está bem documentado. A gravidez e as realidades do parto permanecem envoltas em tabus. Ainda que baseada num reduzido número de fotografias, esta reportagem representa um contributo inestimável para que se conheça melhor o papel daquelas que, assentes na sabedoria geracional, fornecem orientação e tutela, combinando experiência médica e apoio emocional.
Agora que está instalada a polémica em torno da inconstitucionalidade da interrupção voluntária da gravidez (a decisão resultante do litígio judicial que opôs, em 1973, Roe a Wade, foi formalmente anulada em 24 de junho de 2022 pelo Supremo Tribunal de Justiça norte-americano, após nova decisão sobre o caso Dobbs vs Jackson Women's Health Organization), o trabalho de Maggie Smith adquire novas e mais acutilantes leituras. As parteiras retratadas pela fotógrafa são demonstrativas da enorme determinação na hora de dar poder às mulheres para estas fazerem as suas próprias escolhas e adaptarem as suas próprias experiências corporais, quer seja em terminar uma gravidez ou em dar à luz em casa. Quando um processo difícil se torna ainda pior devido a uma pandemia global e a leis restritivas, a necessidade de ser honesto sobre o parto e sobre o próprio corpo torna-se ainda mais premente. Num momento marcado pela separação e morte, estas histórias de conexão e cuidado são especialmente inspiradoras. Cada uma delas é única, e a apresentação de uma diversidade de mães e profissionais que ajudam no parto é crucial a este projeto, pondo a nu alguns dos fardos que elas têm de suportar.
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