“Senta-te, como quando te sentas em frente a um espelho. Conta-me o que guardaste dentro de ti…” “_____ Esta história que contamos _____ é a história de todos _____ e de cada um. _____ Começa em 1922 _____ Tinha 16 anos quando entrei para a fábrica. _____ Atravessa a Segunda Grande Guerra Mundial. _____ Esteve paralisada durante 10 anos. _____ É a história de todos _____ e de cada um. _____ É a história dos dias repetidos _____ Eu fui para lá em 1975 _____ É a história de todos os que viveram o seu fim. _____ À frente de ti, olho-te de novo e as lágrimas vêm-me aos olhos. _____ Vejo tudo abandonado. Tudo partido _____ O que pode sonhar um trabalhador quando a sua fábrica fecha? _____ Que gestos ainda duram para além da memória? _____ Esta é a minha fábrica. _____ Qual é a tua? _______________” (in, “Fábrica de Histórias”)
É no espaço da antiga Hidro-Eléctrica de Estarreja – Fábrica de Descasque de Arroz, no preciso lugar onde começa a erguer-se um núcleo museológico cuja missão primeira consiste na preservação das memórias da cultura do arroz neste concelho do Baixo Vouga Lagunar, que pode ser vista, ao longo da semana, a exposição de fotografia “Fábrica de Histórias”, da autoria de Carlos Gomes. Fotógrafo de cena, teve o “privilégio”, como o próprio refere na folha de sala que acompanha a exposição, de acompanhar o processo criativo homónimo, com texto e direcção de Ricardo Correia, numa produção da Casa da Esquina - Associação Cultural. O projecto foi apresentado à população estarrejense no terceiro fim de semana do passado mês de Junho, sob a forma de Visita Guiada aos espaços onde começa a nascer a Fábrica da História – Arroz. Os registos de Carlos Gomes, que podem ser agora apreciados nesta belíssima exposição, resultam numa “imersão no tempo”, documentando uma “viagem e experiência histórica a um passado recente” que importa preservar.
Entre a cor e o preto e branco, o trabalho de Carlos Gomes toca o visitante pela sensibilidade que se desprende do seu olhar nesta espécie de “regresso ao passado”, neste avivar de memórias na afirmação de marcas identitárias únicas e insubstituíveis. Não participei nas visitas guiadas, não senti de perto a emoção dos testemunhos que, na voz e nos gestos dos actores, ousaram lançar luz sobre o que repousava nas trevas do esquecimento. Mas adivinhei essa emoção nos admiráveis registos fotográficos que nos são agora oferecidos, cada imagem como “um momento de reparação desta ferida aberta que está a ser curada”. Apreciá-los, escutando em pano de fundo as palavras de antigos operários, elas no rotineiro labor de ensacar o arroz em saquinhos de serapilheira, eles com as funções mais pesadas da descarga dos vagões ao trabalho com a maquinaria. Entre todos, uma familiaridade enorme e uma cumplicidade cimentada no esforço de entreajuda, nas partidas que uns pregavam aos outros ou na partilha de momentos bons e menos bons. Uma exposição que é, sobretudo, um contributo para a compreensão do passado e a construção de um melhor futuro.
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