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terça-feira, 6 de setembro de 2022

CERTAME: FAZUNCHAR 2022


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CERTAME: FAZUNCHAR 2022
Figueiró dos Vinhos
13 Ago > 21 Ago 2022


Em Laínte, dialecto outrora usado pelos comerciantes de lanifícios da zona de Figueiró dos Vinhos, “fazunchar” tinha por significado “fazer”. Recuperar a expressão e dar-lhe sentido nos dias que correm foi o desafio que o Município de Figueiró dos Vinhos lançou em 2019 à Mistaker Maker, Plataforma de Intervenção Artística sedeada em Lisboa e fundada por Lara Seixo Rodrigues. É este o ponto de partida de um Festival “onde a arte faz a festa” e que vem apostando na promoção de um diálogo alargado e multilateral entre as mais variadas formas de arte e toda uma comunidade. Perceber a forte identidade de Figueiró dos Vinhos, a riqueza do seu património natural, histórico, arquitectónico e gastronómico, corporizando-o, espelhando-o e exaltando-o mediante uma infinidade de expressões artísticas, acrescentando-lhe novos valores de memória, de autenticidade, originalidade, raridade ou exemplaridade, tal tem sido o grande desígnio dos mentores de uma iniciativa que se afirma, quatro anos passados, como uma marca forte e credível, capaz de gerar visibilidade sobre si própria e sobre um território com tanto para oferecer.

Um pouco à semelhança dos anos anteriores, esta edição do FAZUNCHAR fez assentar a sua programação num valioso conjunto de murais, quiçá a face mais visível do Festival, mas também em instalações, residências artísticas, exposições, workshops, conversas, visitas guiadas, concertos e ainda três acções comunitárias de grande simbolismo e alcance: A “Vila Florida”, que trouxe mais cor e vida às praças e ruas de Figueiró dos Vinhos, o Jornal de Cordel e o incontornável Piquenique. À exposição “Esquecidos”, de Francis.co, e ao concerto de Silly, dediquei, muito recentemente, apontamentos particulares no espaço do blogue. Falarei agora dos murais, do que representam em termos de um espólio que, a cada ano que passa, cresce em número e qualidade, gerando riqueza e beleza e atraindo um número crescente de indefectíveis da Arte Urbana ou de simples curiosos. Antes, porém, deixaria uma palavra a Lara Seixo Rodrigues e à sua equipa pela forma apaixonada como fazem acontecer o Festival, pelo calor e entusiasmo em torno de uma peça ou de um simples detalhe, pelo amor a Figueiró dos Vinhos e àqueles que a visitam.

Quanto aos murais, houve de novo a preocupação de reparti-los entre o coração da Vila e as suas freguesias. Campelo, com os anteriores trabalhos de Mantraste, Third e ainda as sete “miniaturas” de Helen Bur é, cada vez mais, o “satélite” de referência do Festival. Foi aí que o artista portuense Lourenço Providência desenvolveu o seu trabalho, ao qual chamou, justamente, “Campelo”, homenageando a localidade naquilo que tem de mais belo e simples: a candura do casario, os viveiros de trutas que voltam a ganhar vida, a pacatez das suas gentes, as aves no seu voo corrido, um sol que pode também ser lua ou mesmo “um caracol que apareceu no último dia sobre o mural para ajudar a resolver uma parte do mesmo”. Foz de Alge, no extremo sul do concelho, viu o espanhol Taquen entregar-se de corpo e alma à peça que designou por "Garças-reais: sobre a vida lenta, as viagens distantes e o trabalho em equipa”. Nela se condensa um conjunto de reflexões sobre a importância de fazermos juntos o caminho, de sabermos que há um momento para nos determos e outro para recomeçar. “Sempre em companhia, sempre com alguém.”

Antes de adentrarmos a Vila, façamos um pequeno desvio por Aguda onde Tiago Hesp, vencedor da convocatória lançada nesta edição do FAZUNCHAR e que desafiava a comunidade artística a apresentar propostas que trabalhassem especificamente a identidade desta freguesia, nos dá a ver “A Uva e a Vinha – sobre o brasão de Aguda”. Tal como o nome indica, a grande inspiração foi o brazão desta freguesia de Figueiró dos Vinhos, com os seus incontornáveis ramos de videira e cachos de uva, o verde e o roxo como cores predominantes. Um trabalho de enorme beleza que trava um curioso diálogo com a peça produzida por THE CAVER em 2020, ali bem próxima. Entremos agora na Vila de Figueiró e deixemo-nos surpreender pelo talento de Slim Safont e por essa extraordinária mensagem de partilha e encontro entre gerações, em comunhão com a natureza. A peça chama-se “Gerações” e não deixa ninguém indiferente, o mesmo acontecendo com “A Luz de Malhoa”, da autoria de Alba Fabre Sacristán, mural de grandes dimensões que pontua outra das entradas na Vila, desta feita numa parte mais a sul. Registando um momento captado num dos belos recantos da Ribeira de Alge, esta peça é, em si mesma, uma lição de pintura, onde a cor e a luz assumem o valor do ADN de um espelho de água que se estende e desdobra em reflexos mil.

Não nos despediremos de Figueiró dos Vinhos sem visitar as quatro propostas que faltam para completar a oferta de mais uma edição de enorme qualidade e variedade. Regressando a Lourenço Providência, depois do seu trabalho em Campelo, sobrou tempo (e tinta) para homenagear ao seu jeito a colectividade mais antiga do Concelho, a Filarmónica Figueiroense, deixando a sua arte numa das fachadas do edifício. Na fachada da Câmara Municipal, a artista plástica brasileira Arashida deixou-nos “A Recompensa”, belíssimo painel colorido que, com “A Liberdade” e “O Caminho”, instalados numa lateral do Museu e Centro de Artes de Figueiró dos Vinhos e numa esquina da Casa da Cultura, constituem a sua interpretação revista e actualizada sobre a lenda local “As Seis Donzelas”. Mariana, a miserável deixou-nos um belíssimo painel de azulejos intitulado “Companheiro” e que se assume como um “tributo ao pão” (mas também à paz, à habitação, à saúde, à educação…). Finalmente, Juan Rivas trouxe-nos de Espanha a sua arte miniatural, conjunto de oito mini-murais dispostos em árvores, postes elétricos ou sinais de trânsito e que enriquecem o olhar sobre os espaços em que se inserem. Pode ser este o ponto de partida de uma “caça ao tesouro” onde, o mais difícil, será mesmo descobrir o legado completo de quatro anos de FAZUNCHAR.

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