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domingo, 27 de fevereiro de 2022

TEATRO: "As Estrelas Que Hoje Vemos Já Morreram Há 100 Anos"



TEATRO: “As Estrelas Que Hoje Vemos Já Morreram Há 100 Anos”,
de Diana Narciso e Rita Delgado
Apoio à dramaturgia | Joana Bértholo
Cenografia e figurinos | Joana Subtil
Música original e sonoplastia | Pedro Melo Alves
Interpretação | Diana Narciso, Matilde Jalles, Rita Delgado
Produção | Sofia Estriga
90 Minutos | Maiores de 12 anos
Escola do Largo
27 Fev 2022 | dom | 18:30


Espaço, tempo, eventos, coordenadas, universo, física de partículas, relatividade, Einstein. O que tem tudo isto a ver com a vida tal como ela é, com as suas relações e inquietações, as suas certezas e os seus dilemas? Diana Narciso e Rita Delgado escreveram um texto precioso e demonstram que estas questões andam todas ligadas. Dizem elas que partilhamos com as estrelas 97% do mesmo tipo de átomos, ou seja, que somos feitos da mesma matéria. Através das histórias de Maria-mãe-de-Joana-mãe-de-Olívia-mãe-de-Maria vemos como as leis da Física se cruzam com a ficção e operam de maneira insólita: Espaço e Tempo reorganizam-se perante a força exercida pela dinâmica relacional gerada entre estas três mulheres, convidando o espectador a refletir sobre laços maternos, intimidade, individualidade, ciclos e interdependência.

O início da peça é desconcertante. Em palco, Rita Delgado “despe” o papel de uma alienígena para nos dizer que não haverá peça, que uma das actrizes “não veio hoje”, que não poderá devolver o dinheiro dos bilhetes, que esperemos só mais um bocadinho, “só mais cinco minutos”. São sete menos um quarto, diz alguém na plateia. Realidade e ficção misturam-se, a dúvida instala-se. Esperamos… e a peça começa. Uma criança tem medo da noite, tem medo da Lua. A mãe diz-lhe que a Lua é só uma, as estrelas são mais de cem. “É como se tivesses cem sóis no céu em vez de um”, diz-lhe a mãe. Os medos apaziguam-se, nada como o colo de uma mãe, o calor num afago, a calma na voz, para nos fazer sentir melhor. Ou não. Os tempos mudam, os espaços (as vontades) também. Somos corpos em equilíbrio instável que sucessivamente se atraem e repelem. Não saímos disparados rumo ao espaço porque o centro da terra nos atrai com força e nos prende. Num limbo, é onde nos encontramos.

Se é verdade dizer que “As Estrelas Que Hoje Vemos Já Morreram Há 100 Anos” tem no texto a sua grande força, não é menos correcto afirmar que o texto brilha porque há três “estrelinhas” em palco que o fazem brilhar. Diana Narciso, Rita Delgado e Matilde Jalles defendem com brio as suas personagens, desdobrando-se em falas e deixas que fazem delas mães e filhas em simultâneo, ora ternas e maternais, ora insolentes e violentas. O lado de comédia que habita a peça veste-se de burlesco e adivinham-se sorrisos abertos por detrás de cada máscara. Tudo o mais é drama. É ele que toma conta das relações pessoais, estendendo a vida para fora do palco e abrindo-a entre o choro e o riso, tão bela mas tão ingrata, tão dada a duplas interpretações, tão pródiga na oferta de momentos felizes quanto insensível à dor e ao sofrimento. Uma vida equívoca, recheada de mentiras que tomamos como verdades, como se de estrelas se tratasse. Estrelas que hoje vemos mas que estão mortas há cem anos.

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