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segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

CINEMA: "Távola de Rocha"



CINEMA: “Távola de Rocha”
Realização | Samuel Barbosa
Argumento | Samuel Barbosa
Fotografia | Jorge Quintela
Montagem | Tomás Baltazar
Interpretação | Isabel Ruth, Jorge Rocha, Junko Ota, Luís Miguel Cintra, Paulo Rocha, Regina Guimarães, Yujun Washino
Produção | Rodrigo Areias
Portugal, Japão | 2021 | Documentário | 94 Minutos | Maiores de 12
Centro de Arte de Ovar
21 Jan 2022 | sex | 21:30 


Na linha de filmes como “Surdina”, “Listen” ou “A Metamorfose dos Pássaros”, o Shortcutz Ovar voltou a propor uma “Noite Longa”, assinalando desta forma o arranque da 6ª temporada. Congregando o interesse de meia centena de espectadores no belíssimo Auditório do Centro de Arte de Ovar, “Távola de Rocha”, do realizador Samuel Barbosa, foi o filme escolhido, um documentário que permitiu o reencontro com o cinema de Paulo Rocha, figura particularmente querida das gentes de Ovar, onde filmou com a paixão que só ele sabia imprimir às suas obras e onde encontramos parte importante das suas origens. Apresentada por Tiago Alves, a sessão contou com a presença de Samuel Barbosa, figura ligada ao cinema nas áreas da realização e da produção, que trabalhou durante largos anos com Paulo Rocha, desde “Vanitas” (2004) ao filme final “Se Eu Fosse Ladrão... Roubava” (2013) e que também tem parte das suas origens em terras vareiras.

Paulo Rocha tinha a vontade expressa de fazer do seu último filme “um objecto em constante evolução, um arquivo cinematográfico de emoções, manifestações dos lugares e das pessoas”. O projecto pouco além foi das intenções, mas Samuel Barbosa consegue, de uma forma muito pessoal, recuperá-lo e dar-lhe um importante sentido, juntando à roda desta “távola” a família do cineasta, em particular a mãe com quem manteve desde sempre uma cumplicidade enorme, mas também essa “família” maior do mundo do cinema, nomeadamente os actores Isabel Ruth e Luís Miguel Cintra e ainda Regina Guimarães, que assinou o argumento e os diálogos de vários filmes de Paulo Rocha. A estes juntam-se algumas figuras que preencheram parte da vida do realizador enquanto permaneceu no Japão onde teve oportunidade de rodar o belíssimo “A Ilha dos Amores”, bem como as gentes com quem se foi cruzando no âmbito da preparação dos seus trabalhos. Da reunião dos muitos depoimentos, de excertos dos seus filmes e de pequenos trabalhos caseiros em Super 8 pertencentes ao espólio do realizador ou da sua família, resulta este “Távola de Rocha”, documentário intenso, denso e profundamente comovente.

Assumindo um carácter de pesquisa individual, “Távola de Rocha” é o reflexo de uma convivência de grande proximidade entre Paulo Rocha e Samuel Barbosa, mestre e aprendiz, ao longo de mais de uma década. Os universos temáticos do grande cineasta, nomeadamente o seu olhar sobre a vida e a sua transposição para o cinema, surgem aqui particularmente valorizados através de uma abordagem vincadamente pessoal e fortemente emocional. No nosso íntimo cresce a admiração ao recordar filmes como “Verdes Anos” ou “Mudar de Vida”, em particular no espectador vareiro resta uma saudade imensa de um Furadouro que se abria num areal a perder de vista, das companhas à recaxia, dos palheiros e do Chalé do Matos, mas resta sobretudo uma sensação muito forte de que pouco se conhece da enorme dimensão artística, criativa e também humana de Paulo Rocha. A esta junta-se essa outra de que a sua obra não estará cabalmente investigada, tratada e valorizada. Ao tentar dialogar com a obra de Paulo Rocha, Samuel Barbosa vai, como ele, ao encontro das coisas e dos lugares, deixando o convite a que o acompanhemos. Grande, grande é a viagem. E muito bela!

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