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terça-feira, 11 de maio de 2021

LIVRO: "Noite de Insónia"



LIVRO: “Uma Noite de Insónia”,
de Wisława Szymborska
Concepção, selecção de poemas, tradução e posfácio | Teresa Fernandes Swiatkiewicz
Ed. Manufactura, Abril de 2019


“Tenho muita vergonha, eu – ser humano.”

Antologia temática. Bestiário poético e ecocrítico ilustrado. Assim se apresenta “Uma Noite de Insónia”, conjunto de poemas escritos entre 1952 e 2011 por Wisława Szymborska, autora polaca galardoada com o Prémio Nobel da Literatura 1996. Concebido por Teresa Fernandes Swiatkiewicz, uma das primeiras estudantes do Leiturado de Polaco da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, por alturas da comemoração do 40º aniversário da presença da Língua e Cultura polacas no quadro curricular da Universidade de Lisboa, eis o resultado de um feliz encontro de interesses e vontades, de enorme significado e alcance, que nos aporta a visão apurada da poeta sobre as questões ecológicas e existenciais que marcam o seu denso e inquieto universo.

Criteriosamente seleccionados, os catorze poemas que podemos encontrar neste livro mostram-nos o quanto o todo pode ser muito maior do que a soma das partes. É tremenda a profusão de imagens e de sentimentos que cada poema convoca, as leituras que suscita, a forma como nos toma de mansinho, quase inofensivamente, e vai crescendo dentro de nós, as palavras a agigantarem-se com o poder da razão e da verdade. Bestiário, sim. Mas de que lado está a besta? Pensamos na felicidade e sentimos medo. O poema avança num clamor. A terra treme, o corpo treme. Tão longe do que pareciam à chegada, as palavras retiram-se, tumultuosas. Em nós fica o eco do seu grito. Depois, só silêncio. Pesado. De culpa e vergonha feito.

Gatos, lobos, macacos. Um társio. Todos os animais de um circo. “O gafanhoto, o jacaré, a triquina, o moscardo”. Um cão preso a uma corrente curta. Uma leoa e um antílope. Um Yeti que se esconde. Binóculos assestados sobre o mundo, o Homo sapiens innocens observa. Entre bestas, é esta a selva em que nos movemos? Szymborska pede-nos que não façamos juízos precipitados. Que, com cuidado, atentemos no chicote que pende de uma mão, nas correntes ferradas na pata como no pescoço, na dor do abandono, nas caretas assadas e cozidas, nas memórias reduzidas a esqueletos. É este o mundo em que vivemos. Mas será este o mundo que queremos?

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