Páginas

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

LIVRO: "As Mulheres do Meu Pai"



LIVRO: “As Mulheres do Meu Pai”,
de José Eduardo Agualusa
Ed. Quetzal Editores, 1ª edição 2007, 1ª edição Quetzal Maio de 2017


O “pai” a que se refere o título deste romance de José Eduardo Agualusa é Faustino Manso, lendário contrabaixista que deixou a sua marca nos mais importantes salões de baile da África austral, mas também nas mulheres que com ele se cruzaram ao longo de uma vida de aventura e sedução. As mulheres, como veremos, serão sete e a herança ascenderá a dezoito filhos. É na expectativa de saber um pouco mais acerca desse pai que não chegou a conhecer em vida, que Laurentina, a filha mais nova, se faz à estrada na companhia de três homens, no velho carro de um deles. Juntos irão refazer um caminho recheado de surpresas e que se revelará, acima de tudo, de descoberta interior.

Mesclando, assumidamente, a realidade e a ficção, Agualusa oferece-nos um “road book” vivo de imagens e bem humorado, onde partilha com o leitor um conjunto de apontamentos de viagem de cariz pessoal, tornados universais pela qualidade da sua escrita e pela sua imaginação excepcional. Sem nunca perder de vista a figura de Francisco Manso, é sobre cada uma das suas mulheres que Agualusa mais faz incidir a atenção, compondo com elas uma paleta de emoções tão forte e rica que é como se condensassem em si todo o viver e o sentir africano. Em simultâneo, abraça os quatro viajantes num processo catártico de confidências e revelações, mostrando que, tal como o patriarca, ninguém é verdadeiramente quem aparenta ser. Ou, fazendo uso da última frase do livro, que o fecha de forma absolutamente genial: “Nada é tão verdadeiro que não mereça ser inventado”.

Se em termos de conteúdo estamos falados, já dum ponto de vista formal o livro não merecerá nota tão elevada. E isto porque as várias entradas das personagens no livro, as suas reflexões, perspectivas, juízos e contemplações, surgem “sem aviso prévio”, gerando alguma dificuldade em perceber quem é quem, sobretudo numa fase inicial do livro. À confusão segue-se a dúvida e, não raramente, o leitor vê-se obrigado a recuar alguns capítulos para retomar o fio à meada. Para usar uma linguagem cinematográfica, diria que estamos perante um bom filme mas como uma montagem no mínimo discutível. Vencidos os “obstáculos”, é o prazer da boa leitura que vem ao de cima, o humor de Agualusa e o seu olhar irónico sobre uma certa realidade africana (sobretudo angolana) a pontuar cada capítulo, ora fazendo-nos sorrir, ora obrigando-nos a engolir em seco.

Sem comentários:

Enviar um comentário