CONCERTO: Requiem de Mozart
Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música
Coro Casa da Música
Direção musical | Andreas Spering
Interpretação | Christina Landshamer (soprano), Helen Charlston (mezzo-soprano), João Terleira (tenor), Alexander Grassauer (baixo)
Casa da Música - Sala Suggia
08 Nov 2025 | sab | 18:00
Se alguém quisesse perceber como uma orquestra pode elevar uma das obras mais conhecidas e temidas do repertório clássico, bastava ter estado na Casa da Música, ao final da tarde do passado sábado, para ouvir o Requiem de Mozart pela Orquestra Sinfónica do Porto e pelo Coro Casa da Música, sob a direcção de Andreas Spering. Inserido no ciclo “À Volta do Barroco”, o momento foi capaz de devolver frescura e profundidade a uma partitura tantas vezes prisioneira da sua própria fama. Especialista em repertório barroco e clássico, o maestro alemão conduziu uma leitura que privilegiou a clareza e o equilíbrio, sem com isso menorizar o natural dramatismo que a obra encerra. Desde o “Introitus”, o som denso mas flexível das cordas e a articulação precisa do coro mostraram uma concepção em que a arquitectura da música se impôs ao sentimentalismo. A contenção de Spering não apagou a emoção, antes fê-la emergir em limpidez, com uma naturalidade que reforçou o caráter espiritual da obra.
A interpretação centrou-se no que há de humano no “Requiem”, mais do que no seu mito. Mozart escreveu a obra em 1791, ano em que também compôs “A Flauta Mágica” e “La Clemenza di Tito”. Nada na sua escrita desse tempo sugeria uma despedida, e é essa vitalidade que Spering procurou elevar. A orquestra respondeu com um som coeso e transparente, mas foi o Coro Casa da Música quem mais surpreendeu: pela intensidade, pela disciplina e pela expressividade colectiva, capaz de dominar e até de suplantar a própria orquestra nos momentos de maior intensidade dramática. O mérito estende-se ao trabalho do seu maestro adjunto, Pedro Teixeira, cuja preparação meticulosa se refletiu na clareza das entradas, no equilíbrio das vozes e na segurança dos ataques. Entre os solistas, Christina Landshamer, Helen Charlston, João Terleira e Alexander Grassauer formaram um quarteto coeso, de timbres distintos mas plenamente integrados.
Spering conduziu o Requiem com serenidade e fluidez narrativa, dando especial destaque às secções corais. O “Dies Irae” soou incandescente, uma torrente de energia controlada, enquanto o “Rex Tremendae” e o “Lacrimosa” revelaram-se equilibrados entre o fervor e a transparência que marcou toda a interpretação. O “Communio” final brilhou em sobriedade e paz, fechando um final de tarde num raro diálogo entre rigor formal e emoção contida. Se o “Requiem” é um apelo ao descanso eterno, aqui soou antes como um gesto de aceitação e de luz. A Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música e o Coro Casa da Música confirmaram a sua maturidade e excelência, e Andreas Spering revelou-se um intérprete capaz de devolver a Mozart o que nele há de mais essencial: a simplicidade que abriga o sublime. O concerto terminou com uma sensação de reconciliação mais do que de tragédia. O público soube agradecer com um caloroso e prolongado aplauso um tão enorme momento.
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