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segunda-feira, 21 de outubro de 2024

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Digitar aqui para procurar & O corpo como arquivo”



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “Digitar aqui para procurar & O corpo como arquivo”,
de Sofia Yala
Curadoria | Elina Heikka
Encontros da Imagem de Braga 2024
Galeria do Paço - UMinho
21 Set > 26 Out 2024 


Nascida em Portugal, Sofia Yala sempre viveu rodeada de histórias e com acesso a um arquivo que sabe que nem todos os emigrantes têm. Por outro lado, desde cedo percebeu que as instituições são concebidas de forma elitista, feitas para que poucos investigadores as possam aceder, com histórias representativas de um escasso número de sectores da população. No momento em que pegou numa máquina fotográfica, Sofia soube que queria compreender as trajectórias da sua família e contar uma história comum a muitos migrantes angolanos que deixaram o país antes e depois da independência. Alguns ficaram, outros nunca mais regressaram. Para tanto, revisitou, alterou e reconstruiu os seus álbuns e arquivos de família: Os migrantes africanos na Europa, os seus descendentes, a complexa realidade dos corpos racializados e as possibilidades de criação a partir de formas de liberdade em mutação.

“Digitar aqui para procurar & O corpo como arquivo” surge da necessidade de encontrar respostas para as várias questões levantadas em torno das pessoas desconhecidas que encontrou nos álbuns de fotografias. As longas conversas com os familiares levaram-na a aperceber-se de que muita da informação sobre a história da família está fragmentada e perdida para sempre. No entanto, o reconhecimento da importância dos álbuns de familiares negros e da sua representação da história negra funcionou como um impulso pessoal para digitalizar e visualizar a história negra através da prática artística e da expressão diversificada. O tratamento dado aos documentos encontrados numa mala do seu avô – entre notas sobre o local de nascimento dos filhos, datas de nascimento, nomes completos, documentos oficiais e correio internacional – serviu de ponto de partida para um trabalho que foi sendo enriquecido com recurso ao autorretrato e à colagem. Estava em marcha um processo de reconstituição de um espaço paralelo de realidades transgeracionais.

Nesta exposição, a imagem desafia-nos e desafia as formas discriminatórias de apresentar as pessoas. Sofia Yala interessa-se por escavar um pouco e sabotar as noções de realidade, para compreender que o arquivo não é algo deixado no passado e que não deve ser alterado. Pelo contrário, pode sempre ser manipulado, e fazê-lo é um direito que a todos assiste. É isso que a artista faz, remexendo e intervindo nos seus álbuns de família. Entre outros caminhos, a pesquisa levou-a a um arquivo público em Portugal com muitos documentos e imagens da antiga Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE). Entre as imagens, encontrou um perfil do seu avô, que era tratado como um criminoso. Para ela, foi chocante: para a sua família, o avô era um herói que tinha lutado, juntamente com o seu sindicato, num país que ainda não era independente, pelos direitos dos trabalhadores da marinha mercante portuguesa e angolana. Centrar a busca numa pessoa racializada e continuar com essa procura de tentar viver fora da categorização foi tarefa delicada e árdua que a artista decidiu abraçar.

Onde está a história de uma família como a de Sofia? Quem conta essas histórias? Para Sofia Yala, “os corpos que migram ou os que estão sob algum regime tentam sempre apresentar-se de uma forma ‘civilizada’. Tentam mostrar o que os estados e os regimes querem ver. Por isso, muitas vezes vemos uma atuação nos retratos, mas não a realidade. Muitas pessoas tentaram libertar-se através da música ou da comida, mas as imagens são normalmente uma fachada que as protege”. Ao mesmo tempo, essas fachadas não garantem respeito ou reconhecimento total. A artista gosta de jogar com paralelismos. O arquivo permite-lhe trazer para o presente questões que foram e são relevantes. “O Corpo como Arquivo” é o reconhecimento de que houve gerações passadas que tiveram uma série de restrições que Sofia não tem agora, ainda que, em simultâneo, ela viva agora outras experiências que os seus antepassados não tiveram. “Somos todos o resultado de alterações no percurso histórico”, diz Sofia.

[Baseado no texto de Marcela Vallejo, o qual pode ser lido na íntegra em https://webraga.pt/evento/exposicao-digitar-aqui-para-procurar-o-corpo-como-arquivo-de-sofia-yala/]

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