LIVRO: “Uma Noite de Insónia”,
de Wisława Szymborska
Concepção, selecção de poemas, tradução e posfácio | Teresa Fernandes Swiatkiewicz
Ed. Manufactura, Abril de 2019
“Tenho muita vergonha, eu – ser humano.”
Criteriosamente seleccionados, os catorze poemas que podemos encontrar neste livro mostram-nos o quanto o todo pode ser muito maior do que a soma das partes. É tremenda a profusão de imagens e de sentimentos que cada poema convoca, as leituras que suscita, a forma como nos toma de mansinho, quase inofensivamente, e vai crescendo dentro de nós, as palavras a agigantarem-se com o poder da razão e da verdade. Bestiário, sim. Mas de que lado está a besta? Pensamos na felicidade e sentimos medo. O poema avança num clamor. A terra treme, o corpo treme. Tão longe do que pareciam à chegada, as palavras retiram-se, tumultuosas. Em nós fica o eco do seu grito. Depois, só silêncio. Pesado. De culpa e vergonha feito.
Gatos, lobos, macacos. Um társio. Todos os animais de um circo. “O gafanhoto, o jacaré, a triquina, o moscardo”. Um cão preso a uma corrente curta. Uma leoa e um antílope. Um Yeti que se esconde. Binóculos assestados sobre o mundo, o Homo sapiens innocens observa. Entre bestas, é esta a selva em que nos movemos? Szymborska pede-nos que não façamos juízos precipitados. Que, com cuidado, atentemos no chicote que pende de uma mão, nas correntes ferradas na pata como no pescoço, na dor do abandono, nas caretas assadas e cozidas, nas memórias reduzidas a esqueletos. É este o mundo em que vivemos. Mas será este o mundo que queremos?
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