CINEMA: “Judy”
Realização | Rupert Goold
Argumento | Tom Edge, Peter Quilter
Fotografia | Ole Bratt Birkeland
Montagem | Melanie oliver
Interpretação | Renée Zellweger,
Finn Wittrock, Rufus Sewell, Jessie Buckley, Michael Gambon, Lewin
Lloyd, Phil Dunster, Gaia Weiss, Bella Ramsey, Andy Nyman, Fenella
Woolgar
Produção | David Livingstone
Reino Unido | 2019 | Biografia,
Drama, História | 118 Minutos | M/12
Cinema Dolce Espaço
24 Nov 2019 | dom | 16:00
Poderíamos cair na tentação de dizer
que, hoje em dia, já só Hollywood vive obcecada por projectos
biográficos das mais variadas figuras do mundo do entretenimento,
quase sempre pertencendo à música, à televisão ou à sétima
arte. Porém, semelhante afirmação já não é inteiramente
precisa, visto as diferentes indústrias culturais do enclave
audiovisual de cada país também fazeram uso de uma fórmula
aprioristicamente ganhadora: referimo-nos ao estratagema de,
simplesmente, pegar numa estrela mais ou menos conhecida do público
e, à sua volta, construir uma narrativa que possa funcionar como um
retrato da sua carreira, do seu devir pessoal ou de uma combinação
de ambos, tudo centrado num momento específico.
Por vezes a abordagem redunda num
êxito, mas noutras ocasiões cai num desses pântanos do nosso
tempo, devido à manifesta incapacidade de resumir aquilo que está
verdadeiramente em causa. É isto que sucede com Judy (2019), uma
biografia sobre Judy Garland que começa por prometer um
desenvolvimento mais ou menos tradicional e preciso sobre os seus
últimos meses de vida e que, no entanto, acaba por se desfazer
rapidamente, porquanto a realização se obstina em abraçar uma
dinâmica teatral redundante e carregada de sequências descritivas,
sem nada de interesse que possa acrescentar algo ao filme e onde os
diálogos mais não fazem do que acentuar cada um dos lugares comuns
da existência de uma artista em “queda livre”.
Os momentos escolhidos são os que
antecedem a morte da artista, aos 47 anos, seis meses após a série
de apresentações em Londres, no clube nocturno “Talk of the
Town”, ao longo de atribuladas cinco semanas. Nem o director Rupert
Goold nem o argumentista Tom Edge conseguem escapar ao cliché duma
triste espiral por todos conhecida, assente no narcisismo, na
paranóia, no alcoolismo, nos fracassos conjugais, nos problemas
económicos, no excesso de medicação e na insegurança em relação
à sua aparência. Isto para já não falar na exploração laboral
enquanto actriz adolescente, como se a mulher real - de facto -
tivesse sido este desenho melancólico e muito decadente que vemos no
ecrã, sem um instante de felicidade.
A constante “chamada à cena” que
sofreu ao longo de sua carreira, sobretudo numa altura em que ansiava
por paz e por uma vida familiar estável, resume-se a um
rosto carregado de próteses e de maquilhagem, debaixo do qual está
Renée Zellweger, ela própria uma actriz torturada por caprichos
mercantilistas e alvo de uma enxurrada de cirurgias que representam o
pior dos estúpidos sonhos estéticos do “mainstream” (leia-se a
“obrigação” auto-imposta de negar a naturalidade e retardar o
envelhecimento). É notório que a actriz se identifica com o
“calvário” de Garland e sua estigmatização como eterna
protagonista de “O Feiticeiro de Oz”, daí resultando um
desempenho extraordinário, nomeadamente no que toca à sua
interpretação enquanto cantora, o que acaba por salvar o filme.
Abstraindo-nos do facto de ser este um filme pesado, sobrecarregado
por cenas que prolongam a metragem sem algo que o justifique, “Judy”
constitui uma tentativa de prestar homenagem à enorme força de
vontade da enorme actriz que foi Judy Garland, ainda que sem lograr
preencher os múltiplos buracos dramáticos e a sem conseguir
escapar à incessante repetição das mesmas situações
paradigmáticas de sempre.
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