LIVRO: “A Noite não É Eterna”,
de Ana Cristina Silva
Edição de Maria do Rosário
Pedreira
Ed. Oficina do Livro, Fevereiro
de 2016
É ao encontro duma Roménia imune
aos ventos da Perestroika que Ana Cristina Silva nos leva no seu
livro “A Noite não é Eterna”. Nadia, uma jovem mulher, vem de
perder o filho em circunstâncias particularmente dramáticas e
obstina-se na sua sede de vingança, tendo como alvo o próprio
marido, Paul. Do descontrolo inicial à racionalidade dos momentos
seguintes, a mulher vê-se dividida entre a raiva e a impotência,
tendo como pano de fundo o regime sanguinário e totalitarista do
ditador Nicolae Ceauşescu.
“A Noite não é Eterna” é um
romance negro, tanto na sua aproximação literária ao sub-género
do suspense, como nas emoções que o percorrem, pontuadas pela dor e
pelo luto. Personificando em Nadia o vazio de todos quantos se viram
despojados daquilo que tinham de mais íntimo e querido, Ana Cristina
Silva leva mais longe o romance, ampliando essa sensação de
angústia e sofrimento ao enumerar as arbitrariedades dum regime
cujas elites tinham acesso a bens importados e viviam em edifícios
de grande ostentação e onde a população sobrevivia em miséria
evidente e as crianças eram abandonadas à sua sorte em orfanatos,
antecâmaras de doença e morte.
Desta abordagem da situação social
e política da Roménia da era Ceauşescu, retira o livro uma das
suas maiores forças. O lado documental, porém, é claramente
secundário num romance que se foca quase por inteiro na mulher e em
cuja figura a escritora refina laboriosamente o arquétipo da
“mãe-coragem”, capaz de levar os seus propósitos até às
últimas consequências. Para tanto, Nadia aceita correr os mais
terríveis riscos, enquanto na sua boca se repete até à exaustão a
palavra “filho”. E contudo...
Não querendo desvendar a trama –
sobretudo porque penso que este livro merece ser lido -, diria apenas
que gostaria de ver certas ideias desenvolvidas de forma mais
consistente. Que preferiria perceber na íntegra o percurso de
personagens deveras importantes em determinados momentos da acção e
que acabam por desaparecer sem deixar rasto. E que gostaria de
entender melhor as motivações de Nadia ao travestir-se duma certa
moralidade, recuando a memórias do tempo da infância e dispondo-se
a perdoar o imperdoável.
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