CINEMA: “Lucky”
Realização | John Carroll Lynch
Argumento | Logan Sparks e Drago
Sumonja
Interpretação | Harry Dean
Stanton, David Lynch, Ron Livingston, Ed Begley Jr., Tom Skerritt,
Beth Grant, James Darren, Barry Shabaka Henley e Yvonne Huff
Produção | Ira Behr,
Danielle Renfrew, Greg Gilreath, Adam Handricks, Richard Kahan, John
H. Lang, Logan Sparks e Drago Sumonja
Estados Unidos | 2017 | Drama |
88 minutos
Cinema Dolce Espaço, Ovar
08 Dez 2017 | sex | 18:30
Parece-me ver em “Lucky”, filme de John Carroll Lynch estreado esta semana entre nós, a
confirmação de que “a vida é feita de pequenos nadas”. Um
filme que acompanha o quotidiano duma pessoa que dobrou já os
noventa anos, mas cuja vitalidade e perspicácia o mantém atento e
integrado na pequena comunidade à qual pertence. Em “Lucky”, os
pequenos-nadas são mesmo pequenos-nadas. O despertar ao som de
música mexicana, o acender do primeiro cigarro do dia, os exercícios
de ioga, o café, as conversas casuais, as palavras cruzadas, os
percursos, as compras, os concursos de televisão, o palavrão
gritado no mesmo sítio contra o mesmo alvo, tudo é rotina.
E como é que o espectador
sobrevive a hora e meia de rotina? A resposta está em Harry Dean
Stanton, o “Lucky” do filme, personagem ímpar no galarim do
cinema e que tem aqui o papel duma vida. Afastado do grande ecrã
desde 2013, surge agora a interpretar uma personagem fictícia baseada na sua pessoa, naquele que acabaria por ser o seu último
filme, já que morreu no passado dia 15 de Setembro, aos 91 anos de
idade. E fá-lo, como sempre o fez, de forma sublime, sublinhando a
relatividade da vida e provando que “velhos são os trapos”.
Figura omnipresente ao longo do
filme, Harry Dean Stanton catalisa atenções e despoleta emoções.
Ele e a sua personagem confluem numa entidade única, indissociável. O
real mistura-se com a ficção graças a essa capacidade
interpretativa única e, não raras vezes, vemos o filme roçar
as margens do documentário, sem, contudo, invadir esse espaço.
Faces duma mesma moeda, o choro e o riso são para aqui chamados.
Para a posteridade fica a interpretação única de “Volver,
volver”, na qual Harry Dean Stanton se faz acompanhar por um trio
de mariachis, o gesto de rebeldia ao acender um cigarro no interior
do Café e aquele sorriso derradeiro ao desviar os olhos dum cacto com o
triplo da sua altura e o dobro da sua idade.

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