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sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

CINEMA: "Lucky"



CINEMA: “Lucky”
Realização | John Carroll Lynch
Argumento | Logan Sparks e Drago Sumonja
Interpretação | Harry Dean Stanton, David Lynch, Ron Livingston, Ed Begley Jr., Tom Skerritt, Beth Grant, James Darren, Barry Shabaka Henley e Yvonne Huff
Produção | Ira Behr, Danielle Renfrew, Greg Gilreath, Adam Handricks, Richard Kahan, John H. Lang, Logan Sparks e Drago Sumonja
Estados Unidos | 2017 | Drama | 88 minutos
Cinema Dolce Espaço, Ovar
08 Dez 2017 | sex | 18:30


Parece-me ver em “Lucky”, filme de John Carroll Lynch estreado esta semana entre nós, a confirmação de que “a vida é feita de pequenos nadas”. Um filme que acompanha o quotidiano duma pessoa que dobrou já os noventa anos, mas cuja vitalidade e perspicácia o mantém atento e integrado na pequena comunidade à qual pertence. Em “Lucky”, os pequenos-nadas são mesmo pequenos-nadas. O despertar ao som de música mexicana, o acender do primeiro cigarro do dia, os exercícios de ioga, o café, as conversas casuais, as palavras cruzadas, os percursos, as compras, os concursos de televisão, o palavrão gritado no mesmo sítio contra o mesmo alvo, tudo é rotina.

E como é que o espectador sobrevive a hora e meia de rotina? A resposta está em Harry Dean Stanton, o “Lucky” do filme, personagem ímpar no galarim do cinema e que tem aqui o papel duma vida. Afastado do grande ecrã desde 2013, surge agora a interpretar uma personagem fictícia baseada na sua pessoa, naquele que acabaria por ser o seu último filme, já que morreu no passado dia 15 de Setembro, aos 91 anos de idade. E fá-lo, como sempre o fez, de forma sublime, sublinhando a relatividade da vida e provando que “velhos são os trapos”.

Figura omnipresente ao longo do filme, Harry Dean Stanton catalisa atenções e despoleta emoções. Ele e a sua personagem confluem numa entidade única, indissociável. O real mistura-se com a ficção graças a essa capacidade interpretativa única e, não raras vezes, vemos o filme roçar as margens do documentário, sem, contudo, invadir esse espaço. Faces duma mesma moeda, o choro e o riso são para aqui chamados. Para a posteridade fica a interpretação única de “Volver, volver”, na qual Harry Dean Stanton se faz acompanhar por um trio de mariachis, o gesto de rebeldia ao acender um cigarro no interior do Café e aquele sorriso derradeiro ao desviar os olhos dum cacto com o triplo da sua altura e o dobro da sua idade. 

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