Faz-se de palavras, sons e cores o fio invisível que une Portugal e a Galiza. Neles ressoam o pulsar de raízes ancestrais, as memórias da terra, a língua irmã que partilhamos, as melodias comuns que dançamos — como se de um relicário se tratasse: um relicário de histórias, dores, amores e mitos que atravessam fronteiras invisíveis. Nas duas margens do Rio Minho, celebra-se de igual forma a poesia de Rosalía de Castro, com a sua melancolia doce, e os versos de Miguel Torga, cânticos de amor à terra e à alma. Entoamos Uxía e, com ela, o silêncio dos campos e a força das gentes humildes; tal como cantamos Zeca Afonso, expressão viva de um povo que se abraça em dignidade e liberdade. Neste misto de história e cultura comuns — tendo a língua como alicerce — há também lugar para as artes plásticas e para a forma como interpretam “o Atlântico que nos une”: as tempestades, os ventos, a riqueza que do seu ventre retiramos, mas também a sua cólera, a sua força, e a dor que tantas vezes nos confronta e agride.
Patente na galeria principal da Cooperativa Árvore, “O Atlântico que nos Une” é uma exposição colectiva luso-galaica que resulta do trabalho de seis artistas portugueses e seis galegos. Todos diferentes na expressão e na forma de olhar o mundo, mas unidos nesta partilha do viver e do sentir que nos aproxima de forma profundamente fraterna. Antón Sobral, Chelo Rodríguez, Cristina Fernández Nuñez, David Pessegueiro, Eva Tarrío, Evelina Oliveira, Jose Molares, Luísa Gonçalves, Manuela Pimentel, Rosa García, Rui Aguiar e Rui Anahory dão testemunho, através das suas obras, de um mesmo sentimento de pertença e de celebração do muito que temos em comum. Entre a pintura e a escultura, apresentam obras irmanadas no encontro eterno entre passado e presente — um hino de saudade e de festa que transcende fronteiras geográficas para se enraizar no íntimo de quem as contempla. Na forma como convergem, os trabalhos estabelecem entre si um diálogo de cores, formas e texturas que evocam paisagens agrestes e rostos marcados pelo tempo.
Aos olhos do visitante, é o trabalho de pintores e escultores de ambos os lados da fronteira que se abre como uma terra única de fraternidade. No encontro de mãos que se querem livres, há um canto silencioso — uma prece visual pela preservação do que é genuíno e essencial, feito de identidades partilhadas. Como oradores do aço, do barro ou da areia da praia, Eva Tarrío, Rui Anahory e Jose Molares evocam a força bruta da natureza — mas também a sua fragilidade. Rosa García rasga o olhar sobre a floresta, Chelo Rodríguez introduz uma nota de diversidade, Cristina Fernández Nuñez abre uma janela sobre a paisagem, e Manuela Pimentel recorda-nos que “antes de tudo deve-se cuidar da alma”. Uns e outros contam histórias silenciosas — narrativas visuais que atravessam o tempo e a geografia, reforçando uma identidade plural e unida. Na sua arte encontramos a possibilidade de reconstruir e reinventar, num gesto criativo que homenageia a ancestralidade sem perder o impulso do novo. A exposição está patente até ao dia 20 de Setembro.
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