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quinta-feira, 17 de julho de 2025

CONCERTO: Berta Rojas



CONCERTO: Berta Rojas
Festival Internacional de Guitarra de Aveiro
Centro Cultural e de Congressos de Aveiro
13 Jul 2025 | dom | 18:00


Consabidamente, a cultura não tem sido merecedora, por parte da nossa classe dirigente, da atenção e dos apoios devidos, ocupando o lugar de parente pobre aos olhos de uma parte importante da sociedade portuguesa. Acabam por ser as autarquias locais ou entidades privadas a descobrir as realidades de um vasto leque de projectos altamente meritórios, assumindo-os na qualidade de mecenas e garantindo as condições necessárias para que as coisas aconteçam. Está neste caso o Festival Internacional de Guitarra de Aveiro, em ano de estreia, que ao longo de uma semana transformou a cidade num palco de cordas mil, graças a um diversificado conjunto de manifestações musicais e artísticas em torno da guitarra. Concertos, masterclasses, cinema, um Encontro Nacional de Professores de Guitarra e uma Conferência Internacional foram núcleos de um evento estrategicamente pensado e que soube posicionar-se, desde a primeira hora, com a ambição de vir a tornar-se uma referência no panorama dos festivais de guitarra a nível internacional.

Cabeça de cartaz do certame, a guitarrista paraguaia Berta Rojas subiu ao palco do Centro de Congressos de Aveiro ao final da tarde do passado domingo para o concerto de encerramento. Trazia consigo o reconhecimento do público e da crítica como uma das mais renomadas intérpretes de guitarra clássica da actualidade, alicerçado na conquista de um Grammy Latino para Melhor Álbum Clássico, com o seu trabalho “Legado” (2022). E foi precisamente por aqui que a artista começou, interpretando duas peças de Ida Presti, compositora clássica francesa e, para muitos, “a maior guitarrista do século XX, e possivelmente de todos os tempos”. Títulos à parte, Presti desempenhou um papel extraordinário ao mostrar o valor da mulher num mundo dominado, quase em exclusivo, por homens, abrindo portas a que muitas outras mulheres mostrassem o seu potencial e valor e singrassem no mundo da música. “Segovia” e “Danse Rythmique” foram os dois temas tocados, intercalados por “Idylle pour Ida”, de John Duarte. Na primeira parte do concerto seria ainda possível escutar, de Federico Moreno Torroba, “Sonatina”, sendo evidente o significado da escolha destas peças, mas sobretudo a técnica excepcional e a habilidade expressiva de Berta Rojas. Navegando cuidadosamente pelas melodias flutuantes das peças, a guitarrista pôs em destaque a sensibilidade rítmica dos compositores, o seu talento melódico e um suave - mas colorido - cromatismo.

A segunda parte do concerto foi toda ela dedicada a Agustin Barrios Mangoré, virtuoso guitarrista e compositor clássico paraguaio, amplamente considerado um dos maiores intérpretes e indiscutivelmente o compositor mais prolífico para guitarra de sempre. Berta Rojas foi exímia na interpretação das várias peças eleitas para o alinhamento desta segunda metade, em particular a incontornável “Catedral” e, já no “encore”, um maravilhoso “Choro da Saudade”. No ouvido ficam influências da música folclórica sul-americana e centro-americana nas composições de Agustin Barrios, mas também texturas que vão beber aos clássicos, nomeadamente a Johann Sebastian Bach. Comovente, hipnótica, a música interpretada com tanta maestria e emoção convida-nos a ver nela um elemento aglutinador de esforços e talentos, independentemente dos nomes, nacionalidades, épocas ou cor da pele de quem deu o seu contributo para o estudo, evolução e consolidação dos mais variados estilos musicais em torno deste instrumento tão amplamente divulgado. Um enorme concerto de uma enorme guitarrista, marcado pela negativa pelas péssimas condições do Auditório, com assentos desconfortáveis e a rangerem ao mínimo movimento, uma sala impossível de calor, espectadores indiferentes à necessidade de desligarem os telemóveis e um fotógrafo que fez da sua câmara uma metralhadora e rivalizou em protagonismo com a artista.

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