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quinta-feira, 10 de abril de 2025

CONCERTO: "Free Celebration" | João Lencastre



CONCERTO: “Free Celebration” | João Lencastre
Com | João Lencastre (bateria), Ricardo Toscano (saxofone alto), Pedro Branco (guitarra), João Bernardo (teclados e sintetizadores), Nelson Cascais (contrabaixo) e João Pereira (bateria)
Ovar em Jazz 2025
Centro de Artes de Ovar - Caixa de Palco
09 Abr 2025 | qua | 21:30


Depois de ter ousado revelar-se ao mundo em 2018, o Ovar em Jazz é hoje uma história de sucesso. Sete anos volvidos sobre esse momento inaugural, percebe-se que são muitas as apostas ganhas e reconhece-se o trabalho consistente que foi sendo desenvolvido e que faz com que ele seja hoje um dos mais apelativos e bem organizados Festivais de Jazz do país. Agora que está de volta, trazendo consigo, ao longo de quatro intensos dias, uma nova rodada de concertos, encontros, conversas, escuta e partilha, o certame abre-se de novo aos mais diversificados públicos, oferecendo a possibilidade de experimentar e vivenciar momentos únicos de gozo e fruição da melhor música. O pontapé de saída desta sétima edição teve lugar na noite de ontem com o projecto “Free Celebration”, do baterista João Lencastre, e que juntou em palco, para além do seu mentor, algumas das mais importantes figuras da cena jazzística nacional: Ricardo Toscano (saxofone alto), Pedro Branco (guitarra), João Bernardo (teclados e sintetizadores), Nelson Cascais (contrabaixo) e João Pereira (bateria). Foram eles que, no ambiente intimista da caixa de palco do Centro de Artes de Ovar, fizeram desta uma noite inesquecível, de liberdade e celebração.

Liberdade e celebração. Na força dos pressupostos que se abrigam nos dois conceitos reside a força do projecto de João Lencastre. Celebração, porque se trata de abraçar a música do saxofonista Ornette Coleman e dos pianistas Herbie Nichols e Thelonious Monk, estrelas maiores do firmamento do Jazz, no respeito pela verdadeira identidade das várias composições. A liberdade vem da abordagem a alguns dos temas referenciais deste trio de gigantes, fundada na veia criativa do sexteto, na capacidade de improvisação que a todos une, nas constantes mudanças de ritmo que sabem imprimir à música, no bom gosto dos arranjos coloridos e vibrantes. Se dúvidas restassem, o momento inteiramente livre que preencheu o início do concerto bastaria para as dissipar. Em modo dissonante, a combinação de solos foi-se “arrumando” num todo harmonioso, mostrando o quanto de intensidade e emoção pode estar contida numa peça de Jazz, sobretudo se é uma daquelas que, ao seu jeito, possui um carácter único e irrepetível. A levar com todo aquele “free” em cima, o público tinha aqui a possibilidade de tomar uma decisão. Entre o “ama-o ou deixa-o”, não se consta que alguém tivesse saído da sala.

Plástica, orgânica e íntegra, a música tomava conta de público e músicos, Ricardo Toscano a mostrar-se em grande forma ao arrancar do seu saxofone alto as mais sedutoras frases com “Giggin’ ” e “Congeniality”, de Ornette Coleman, enquanto João Bernardo a fazer magia com os teclados em “The gig”, de Herbie Nichols. Seguiram-se “Shuffle boil” e “Skippy”, dois temas tão deslumbrantes quanto desafiantes assinados no original por Thelonious Monk, para logo se regressar a Ornette Coleman com “Kathelyn Gray”, uma balada cuja dolência o saxofone de Toscano sublinhou na perfeição, oferecendo o mais delicado, pausado e distendido momento da sessão. Herbie Nichols fez-se de novo ouvir em “The Third World”, mas o melhor estava guardado para o final, com dois temas de Ornette Coleman, “Toy Dance” e “Forerunner”, sublinhados pelo diálogo contrastante entre as baterias de Lencastre e João Pereira e pelo trabalho empolgante de Pedro Branco em cima (e em baixo) da sua guitarra. Sem que os músicos abandonassem o palco, o “encore” trouxe-nos “Humph” de Thelonious Monk, fazendo dos “descontos” um dos momentos capitais do “jogo”. Jubilatório, exaltante, arrebatador, vivo e livre, o concerto coloca a fasquia do Ovar em Jazz 2025 a um nível muito alto. A coisa promete.

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