OPERETA: “A Nossa Aldeia”,
de Egas Moniz
Adaptação, direcção artística, encenação e cenografia | Leandro Ribeiro
Composição e direcção musical | Vítor Sousa
Figurinos e adereços | Marta Baldaia
Coreografia | Vera Lopes
Captação, edição de vídeo e fotografia de cena | Diogo Marques
Interpretação | Gabriel Garrido, Ana Rodrigues, Marco Nunes, Sara Moreira, José António Stréna, António Alves, Armanda Queirós, Margarida Laranjeira, Ana Paula Lapas, Gustavo Silva, Emília Maia, Luna Rodrigues, Carolina Santos, Bernardo Azevedo, Patrícia Quintino, Mónica Pinto, Otília Borges, Dionísia Santos, Ana Rita Ferreira, Palmira Baptista, Maria João Melo, Luís Rola, José Marques, Diana Coutinho, Maria Guimarães, Joana Guimarães, Vítor Sousa, Mariana Valente, Rita Lucas, Flávia Lucchi, Bruno Azevedo, Ana Moutela, Francisco Laranjeira, Paulo Santos, Jorge Azevedo, Fábio Vaz, Cândida Jardim, Hernâni Sá e comunidade estarrejense.
Produção | Município de Estarreja, No Sorriso da Lua e Sol d’Alma - Associação de Teatro
120 Minutos | Maiores de 6 Anos
Cine Teatro de Estarreja
30 Nov 2024 | sab | 21:30
29 de novembro de 1874. Nesta data, nascia em Avanca aquele que viria a ser o Prémio Nobel da Medicina em 1949, o médico e cientista António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz. Ao cumprirem-se 150 anos sobre a efeméride, o Município de Estarreja apresentou ao público o espetáculo multidisciplinar “A Nossa Aldeia”, baseado na opereta que Egas Moniz escreveu e levou à cena na Casa do Marinheiro a 22 de setembro de 1920. A história original conta-se em dois actos e retrata a chegada a Avanca, vindos de Lisboa, dos irmãos José Maria e Maria José, a quem o Regedor obriga a abrir as malas para investigar se não traziam bombas, pois “com gente de Lisboa é preciso ter muito cuidado”, numa alusão irónica aos distúrbios constantes na capital. Os irmãos vêm à procura da “cadeira marcónica”, um aparelho maravilhoso que permite viajar no tempo e que os levará a apreciar o contraste entre a “Avanca do passado”, que cultivava a distinção e as boas maneiras, a “Avanca de hoje”, que apreciava a vida simples, e a “Avanca de amanhã”, dos “sports” e do “feminismo”, que dançava o “foxtrot” e o “twostep” e que dispunha de um teatro em que actuavam cantores vindos de Paris pelo Sud Express. Entretanto chega um rapaz, o Manuel da Rosa, que está de partida para a América, para onde iria emigrar, deixando chorosas as moças da terra.
Espectáculo que, na sua multidisciplinaridade, abraça a figura eclética, dinâmica e empreendedora de Egas Moniz, “A Nossa Aldeia” é um arrojado exercício artístico que contou com o envolvimento de mais de uma centena de elementos, entre actores, figurantes, músicos e equipa técnica. A união do texto original com um aturado trabalho de investigação sobre a vida e obra do Nobel da Medicina forneceu a matéria-prima para a construção dos vários quadros que a peça contempla, aos quais Leandro Ribeiro soube acrescentar emoção, ironia e humor em doses generosas, desenhando um retrato de época que, bem vistas as coisas, acaba por se revelar particularmente actual. Mas se o trabalho de adaptação da obra e a sua encenação envolveram enormes desafios, o que dizer da parte musical cuja partitura original, da autoria de Estefânia Macieira, cunhada de Egas Moniz, e do condiscípulo Alberto Rego - além de incluir melodias tradicionais e fragmentos de outras origens, como a ópera “Manon” de Massenet -, se perdeu. Apoiando-se nas anotações de Acafem (pseudónimo sob o qual Egas Moniz escreveu a opereta), Vítor Sousa assumiu a tarefa de compor uma nova partitura, fazendo o acompanhamento da peça nas suas diversas variações e revelando-se em engenho e virtuosismo nos quadros estritamente musicais.
Imaginativo, ousado, irreverente, provocador, o espectáculo oferece momentos de boa disposição, a começar na longa viagem que leva os irmãos até Avanca, numa sucessão inesgotável de meios de transporte. A interpretação de uma cantiga na festa de despedida de Manuel da Rosa é um momento de grande emoção, tal como o excerto da ópera “Manon”, n’O Grande Lírico Avancanense, cantado a quatro vozes. A jornada das peixeiras que, de canastra à cabeça, levavam a sardinha da Torreira até ao Loureiro não ficou esquecida, como não ficaram esquecidas as colecções do Marinheiro, as lavadeiras no Rio Gonde, a saborosa broa de Avanca e uma Santa Marinha rezingona. Ao longo de quase duas horas houve alecrim e camarinhas pelo chão, um amolador de facas, tesouras e línguas, um rally automóvel, o desfilar dos ofícios, Carmen Miranda e o reclame radiofónico da Companhia de Curtumes de Antuã, os anúncios da Nestlé, as cadeiras da Adico nas esplanadas de Paris, uma cigana a ler a sina, um coro de omnipresentes alcoviteiras, burros em figura de gente e gente em figura de burro. O tema da emigração assumiu lugar de destaque, sobretudo as ligações inquebráveis entre quem parte e quem fica. A multiplicidade de referências às gentes e aos lugares arrancou gargalhadas à plateia e o resultado é de aplaudir pela inteligência e dignidade da obra e pelo empenho de todos quantos nela participaram. Caso fosse vivo, Egas Moniz sentiria orgulho em ver, na nossa aldeia, esta versão da sua opereta.
Bom dia, Sr. Joaquim Margarido, agradeço os pormenores da sua publicação que colmataram uma ou outra referência que me escaparam. Foi, de facto, um fantástico espetáculo que muito honra o Município de Estarreja e o saber, virtuosismo, arte, boa vontade e empenho de todos os que contribuíram para o seu nascimento e apresentação ao público.
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