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quarta-feira, 6 de novembro de 2024

CONCERTO: "EnCanto Sinfónico"



CONCERTO: “EnCanto Sinfónico”
Comemoração Cante Alentejano | 10 Anos Património UNESCO
Direcção musical | Carlos Amarelinho
Coliseu dos Recreios de Lisboa - Sala Principal
03 Nov 2024 | dom | 19:00


Conhecido pelas suas características de canto polifónico tradicional em duas partes, o Cante Alentejano tem raízes profundas nas comunidades rurais do Alentejo. Este estilo musical não só retrata temas ligados ao trabalho agrícola, à vida rural e à natureza, mas também aborda aspetos emocionais como o amor, a maternidade e a religião. Interpretado por grupos corais que podem ter até trinta membros, com vozes organizadas entre “ponto”, “alto” e “baixo”, criando uma harmonia vocal distintiva, o Cante projecta-se para lá da sua dimensão musical, desempenhando um papel crucial na vida social das comunidades alentejanas. Para os seus praticantes e apreciadores, é um elemento central de identidade e pertença, que contribui para a coesão social e para o diálogo intergeracional, permitido também que muitas mulheres se afirmem no espaço público através de uma manifestação tradicionalmente dominada por homens. Inscrito na lista representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade a 27 de novembro de 2014, o Cante Alentejano é, cada vez mais, um elemento preponderante na promoção da identidade alentejana e na projeção da cultura portuguesa além-fronteiras.

Quando se cumpre uma década sobre a efeméride, a Câmara Municipal de Serpa / Museu do Cante Alentejano trouxe ao Coliseu dos Recreios de Lisboa um concerto “único”, no qual participaram onze grupos corais do concelho, acompanhados por uma Orquestra Sinfónica composta pelos elementos da Banda Filarmónica de Serpa e por várias dezenas de músicos convidados, sob a direcção do maestro Carlos Amarelinho. Com casa cheia, o Coliseu foi palco de uma viagem pelas melodias e harmonias que há séculos ecoam nas planícies do Alentejo. Porém, nem tudo foram rosas nas duas horas de duração do concerto. A tentativa de dar outras asas ao Cante e de o tornar (ainda) mais universal mediante a harmonização das vozes com os instrumentos da Orquestra, “esbarrou” numa tradição que dispensa acompanhamentos instrumentais. Uma parte do público não quis ou não soube valorizar a capacidade do maestro Carlos Amarelinho em interpretar o cancioneiro das modas populares alentejanas e em saber embalá-lo com os seus arranjos, sendo muitas as vozes que reclamaram o Cante na sua forma mais pura e genuína. Afinal, tudo está bem quando acaba bem e o final, com mais de duas centenas de cantadeiras e cantadores em palco, foi verdadeiramente apoteótico.

“Mas que dia tão bonito / Ninguém queria acreditar / O Alentejo é património / Pelo seu lindo cantar.” Depois do instrumental “Infinity Chase”, não podiam ser mais apropriadas as primeiras palavras cantadas nas vozes do Grupo Coral e Etnográfico da Casa do Povo de Serpa a quem coube, há dez anos, a responsabilidade de representar o Cante Alentejano em Paris, aquando da sua integração na lista do Património Imaterial da Humanidade da UNESCO. Foi este o primeiro grupo a pisar o palco do Coliseu, ao qual se seguiram as Ceifeiras e os Camponeses de Pias, os Arraianos e as Flores do Chança de Vila Verde de Ficalho, o Madrigal e o Coral e Etnográfico de Vila Nova de S. Bento, os Camponeses de Vale de Vargo ou os Cantadores de Aldeia Nova de S. Bento. Oportunidade para escutar temas como “Não Quero Que Vás à Monda”, “Lá Vai Serpa, Lá Vai Moura”, “Vamos lá Saindo”, “Fui Colher Uma Romã”, “Gota de Água”, “Alentejo, Alentejo” ou “Grândola, Vila Morena”. Procurando disfarçar a frustração de ouvir este Cante “adulterado”, o público acabou por fazer as pazes com a Orquestra e, pelo que (também) cantou e aplaudiu os grupos em palco, percebeu-se que não terá dado o tempo por mal empregue.

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