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domingo, 4 de novembro de 2018

CONCERTO: "Ethan Iverson & Mark Turner"



CONCERTO: “Ethan Iverson & Mark Turner”
A Jazz Supreme
Sala Vanni, Florença
26 Out | sex | 21:15


Lentamente dedilhadas, as notas do piano começam a fazer-se ouvir em sonoridades que remetem para um ambiente de profunda nostalgia. É Outono em Florença e as ruas de Oltrarno estão agora mais sombrias, as folhas descem das árvores e esvoaçam em espirais de vento, o cheiro das castanhas assadas invade o ar e revoadas de estorninhos puntilham o céu. Apetece chamar “Piazza del Carmine” a esta música de formas classicistas, quase raveliana, que teima em sugerir imagens na nossa mente e que abre o concerto da dupla nova-iorquina Ethan Iverson e Mark Turner na Sala Vanni, em Florença, paredes meias com a Capela Brancacci. Trata-se de “Lugano” e é o primeiro tema do álbum “Temporary Kings” (ECM, 2018), trabalho de estreia de duas das mais distintas vozes da cena jazzística actual. Como ficou bem provado neste concerto!

Distanciando-se dum universo marcadamente intimista, o concerto prossegue com “Giant Steps”, revisitação de um dos temas maiores de John Coltrane e recriação das jam sessions de início dos anos 1990, altura em que Iverson e Turner travaram conhecimento, encetando uma carreira incrível nesse agrupamento maior que dá pelo nome de Billy Hart Quartet e que ainda recentemente tivemos o prazer de escutar na Casa da Música, com Joshua Redman no papel de convidado. Depois de um verdadeiro show de saxofone, regresso a “Temporary Kings” em toada de blues com “Unclaimed Freight” e depois com “Myron's World”, uma balada pungente da autoria de Mark Turner, de novo de cariz clássico e dedicada ao irmão.

Para a parte final do concerto estava reservado um dos momentos mais altos com a interpretação de “Chelsea Bridge”, um tema de Billy Strayhorn gravado originalmente por Duke Ellington. Da interpretação magistral de Iverson e Turner sobra um sentimento de felicidade indescritível, uma Ponte Vecchio a unir Florença e Nova Iorque, o mesmo ar outonal da Piazza della Signoria a espelhar-se pela Quinta Avenida, as árvores tingidas de vermelho no Giardino di Boboli como no Central Park. A terminar, ainda o álbum “Temporary Kings” e o tema “Dixie's Dilemma”, uma composição de Warne Marsh onde a melodia, harmonia e ritmo se revelam de forma esplendorosa na “voz” instrumental da dupla. O ponto final mais que perfeito num concerto absolutamente extraordinário!

[Foto: Wall Street Journal / wsj.com]

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