EXPOSIÇÃO DE PINTURA: “Disco”,
de Vivian Suter
Curadoria | Sérgio Mah
MAAT – Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia
30 Out 2024 > 17 Mar 2025
Há cerca de quarenta anos, a artista suíço-argentina Vivian Suter, depois de uma viagem solitária para visitar locais arqueológicos na Mesoamérica, decidiu instalar-se em Panajachel, pequena povoação predominantemente habitada pela comunidade indígena Cakchiquel, um dos povos maias maioritários na Guatemala. Desde então, a artista reside e trabalha numa antiga plantação de café, um lugar com uma vegetação deslumbrante, uma pequena floresta e um jardim, a que a artista chama o seu estúdio. Ela encontrou aqui um cenário estimulante onde se entregou a uma prática experimental, solitária e obsessiva, através da qual foi constituindo uma linguagem plástica única com as formas vivas deste lugar. Vivian Suter pinta habitualmente no meio do jardim, em telas montadas sobre grades que serão mais tarde retiradas, e utiliza várias técnicas e materiais que incluem tinta acrílica, óleo e pigmentos misturados com cola de peixe. O que contemplamos nas suas pinturas predominantemente abstractas pode ter sido gerado pela visão ou simplesmente pela presença inspiradora de um detalhe ou da massa de vegetação que a rodeia.
Ao serem pintadas no exterior, onde frequentemente permanecem durante um período de tempo variável, as telas estão sujeitas à acção dos elementos, incorporando folhas, detritos, restos de insectos ou as marcas deixadas pelos três cães da artista, o mais travesso dos quais, Disco, dá título à exposição. É um trabalho colaborativo, com total abertura para integrar os vestígios e os efeitos casuais e imprevisíveis da natureza, os ritmos, as formas e as forças que têm origem e se abrigam nela. Em 2005 e 2010, duas tempestades provocaram estragos consideráveis no estúdio de Vivian Suter, deixando muitas das suas pinturas cobertas de água e lama. Ao olhar para as pinturas danificadas, a artista percebeu que a terra molhada e seca sobre o que havia pintado acrescentavam algo que só este tipo de circunstâncias inesperadas possibilitam. Foi a partir desse momento que a precariedade, a deterioração e a regeneração, foram sendo igualmente encaradas como atributos da pintura, como uma forma complementar de testemunho da relação íntima e sensível com as contingências da natureza.
A prática pictórica de Vivian Suter não se organiza por séries, contudo é possível agregar trabalhos que parecem derivar de uma mesma ideia, tema ou processo criativo, ou que apresentam aspetos comuns, semelhanças, afinidades formais: telas que acumulam e sobrepõem manchas, derrames e arrastamentos multicolores, configurando planos densos e caóticos onde presumimos processos de transmutação e metamorfose; grelhas que decorrem da visão do parapeito do seu estúdio, mas que lembram janelas; perfis de animais ou de plantas; traços e colunas verticais que indiciam a observação de troncos de arbustos ou árvores, mas também linhas e massas horizontais que evocam disposições topográficas ou deslocações de terra; varrimentos verticais que sugerem movimentos de queda, como a chuva; formas circulares que podem ser inspiradas em detalhes de plantas, frutos ou gotas de orvalho; planos monocromáticos não uniformes; desenhos que insinuam pequenos organismos. O que se descreve são obviamente conjecturas, hipóteses num vasto horizonte de possibilidades.
Nas exposições, as pinturas podem ser apresentadas de diferentes maneiras: montadas directamente nas paredes, suspensas a partir do tecto ou colocadas em estruturas similares às que se encontram no seu pequeno armazém em Panajachel. Vivian Suter trata cada tela como algo flexível e adaptável, podendo assumir distintas formas e posições, em que frequentemente a parte traseira é visível, com um estatuto equivalente ao da frente pintada. Além disso, as pinturas não têm uma posição definida, podendo ser apresentadas numa posição horizontal ou vertical, individualmente ou como parte de um conjunto. A forma como são expostas evidencia o seu caráter objectual, como esculturas leves que por vezes se agitam devido à acção dos visitantes ou da ventilação natural ou artificial. Nesta exposição estão reunidas mais de quinhentas pinturas realizadas nos últimos dez anos, incluindo um número significativo de obras inéditas. “Disco” é coproduzida com o Palais de Tokyo, Paris, onde será apresentada no verão de 2025.
[Texto baseado no Guia da Exposição, o qual pode ser consultado em https://maat.pt/sites/default/files/2024-10/Vivian-Suter_guia-exposicao_0.pdf]
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