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segunda-feira, 20 de outubro de 2025

CONCERTOS & CONVERSAS: Ovar Expande ‘25 (III)



CONCERTOS & CONVERSAS: Ovar Expande ‘25 (III)
Com Lana Gasparøtti, IBSXJAUR e The Legendary Tigerman
Escola de Artes e Ofícios
18 Out 2025 | sab | 21:30


Energia, ritmo, performance, alta rotação, muito suor e, por certo, algumas lágrimas, marcaram o fim desta sexta edição do Ovar Expande. Palco aglutinador dos interesses e vontades de uma organização atenta, de músicos empenhados em dar o melhor de si na defesa dos seus projectos e de um público empático e entusiasta, a Escola de Artes e Ofícios esteve ao rubro com três concertos em crescendo, três propostas vibrantes que fizeram do serão um momento único, daqueles que ficam para a história do certame como um dos mais apelativos e aclamados de sempre. Assumindo-se como pianista, compositora e produtora, Lana Gasparøtti abriu a noite em festa, trazendo consigo “Dimensions” (2024) e com ele uma estética sonora e visual rica em detalhes e de escuta intensa e viva. Com uma forte presença em palco, a artista mostrou ambição na forma de conciliar o espírito exploratório do jazz e a sua vertente de improvisação, com a pulsação rítmica e a estética da electrónica e do hip-hop, construindo um “jazz dançável”, disposto a lançar pontes tanto entre os músicos como com público. Percebe-se um cheirinho de Chick Corea e Herbie Hancock, do jazz de fusão dos anos 1970, em temas como “Missing Files”, “Dreaming”, “Mar” ou “Dimensions”, mas Gasparøtti arrisca numa linguagem musical que ousa desafiar classificações convencionais, apostada que está numa experiência sonora moderna e de fronteiras abertas. 

Depois de um muito prometedor e aplaudido início de noite, o público foi convidado a descer um piso e a ouvir a dupla IBSXJAUR, tendo à sua espera um momento fortemente performativo em torno do novíssimo “Sanity”, álbum lançado no dia anterior com o carimbo Cuca Monga e a fazer no Ovar Expande a sua estreia ao vivo. Atravessando a sala com um chapéu de chuva aberto, JAUR (leia-se “Jôr”) enfrentou o auditório disposta a deixar tudo em palco e a transformar a Sala Galeria da Escola de Artes e Ofícios numa pista de dança subterrânea. Irreverente, destemida, de uma energia ilimitada, a artista transmite uma autenticidade e uma carga emocional gigante à sua música, ligando-se a uma parte da audiência num plano altamente empático, enquanto a batida e a produção de INFRABASSESATURE conduz a uma imensidão de estados de euforia rítmica que fazem do concerto um espectáculo dentro do espectáculo. Temas como “The Molt”, “Echo” ou “Sangfroid” mostram o quanto de techno e drum & bass habitam a música dos IBSXJAUR, mas há também “Circles” ou o belíssimo “Up! ft. Marianne” a revelar a sua matriz pop, vector orientador e parte intrínseca do projecto. O que verdadeiramente impressionou na música da dupla foi a sua capacidade de transitar entre os conceitos de “concerto” e de “clube”, de articular uma narrativa lírica com a produção underground e de levar a música a assumir, em simultâneo, o palco e a pista de dança.

Se foi muito o público presente na Sala Galeria, foi muito mais aquele que encheu de emoção e aplauso a belíssima Sala Expande para escutar um dos cabeças de cartaz do certame, The Legendary Tigerman. Despojado das habituais cadeiras, o espaço foi pista de dança no concerto que encerrou a sexta edição do certame, acolhendo um carismático Paulo Furtado e a uma sonoridade muito própria, fonte de redescoberta e projecção do blues para o século XXI. Escusado será dizer que, mal ecoaram na sala os primeiros acordes de “New Love”, os corpos não mais tiveram sossego. É impossível permanecer imune à estética provocadora e performativa do artista em palco - extraordinariamente acompanhado, diga-se, por Mike Ghost na bateria e Sara Badalo na voz -, numa fusão de blues, rock, punk e elementos electrónicos. Crua, sensual e cinematográfica, a sua música convoca universos de estrada, solidão e rebeldia. “Ghost Rider”, “Naked Blues”, “Motorcycle Boy” ou “These Boots Are Made For Walkin’”, a última numa revisitação de um clássico de Nancy Sinatra da década de 1960, são disto exemplos acabados. Como o são “The Saddest Thing to Say” ou “True Love Will Find You in the End”, dois temas que integram esse marco incontornável na música portuguesa que é o álbum “Femina”. Entre a autenticidade e a inovação, o fecho ideal de uma edição de grande nível, prova da afirmação do Ovar Expande num plano superior do panorama de certames do género no nosso país.

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