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quarta-feira, 2 de julho de 2025

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: "A Torre dos Clérigos" | Sérgio Jacques



EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA: “A Torre dos Clérigos”,
de Sérgio Jacques
Torre dos Clérigos
13 Jun > 30 Jul 2025


“Na sua mágica contemporaneidade, a Torre dos Clérigos persiste, 300 anos depois da chegada de Nasoni ao Porto como motivo inspirador de criadores literários e artísticos.”
Joel Cleto

Ex-libris incontornável da cidade do Porto, a Torre dos Clérigos ergue-se sobre o casario com os seus quase 76 metros de altura, o que faz dela uma das mais altas torres do género no nosso país. Jóia do Barroco, projectada por Nicolau Nasoni e erigida entre 1732 e 1749, domina a paisagem citadina, atraindo o olhar de locais e visitantes onde quer que se encontrem. Haja pernas para isso e não deixa de ser tentador subir os seus 225 degraus para ter a recompensa de uma vista deslumbrante sobre o Porto e a cidade de Gaia, com o Douro de permeio. Os que não se atrevem, quedam-se pelas praças que a circundam, apenas para admirá-la no que tem de majestade e altivez e, num olhar mais atento, descobrir-lhe a harmonia e beleza dos seus inúmeros detalhes. Há também os que se cruzam nas ruas que dela partem ou nela desembocam, as mais das vezes vendo-a sem a ver, que a pressa de apanhar o autocarro ou de chegar a horas à consulta no Santo António é muita. Há, enfim, Sérgio Jacques e o seu olhar, capaz de captar o visível e de nos envolver naquilo que apenas se adivinha.

Aliando a arte e a sensibilidade que fazem dele o excelente fotógrafo que é, ao conhecimento que tem da cidade que o viu nascer, Sérgio Jacques desenvolve um corpo de trabalho que se afasta do cânone e aposta mais no que sugere do que naquilo que verdadeiramente mostra. A preto e branco, a série escapa ao conceito clássico de definição ou nitidez, as imagens desfocadas, tremidas, imprecisas à vista do visitante, como que a sublinhar o propósito de o inquietar, de o questionar sobre a sua relação com o monumento e com a própria cidade do Porto. Nas memórias que convocam – outros tempos, outras paragens –, as fotografias carregam em si o coração de uma cidade no seu incessante pulsar, ante o olhar vigilante e atento da magnífica Torre. Difusas, mostram o que de efémero pode haver numa relação que não se compadece com contemplações. Etéreas, misturam o dito brejeiro com a cacofonia em todas as línguas, a ementa mais elaborada com o pastel de bacalhau. Irreais, cruzam a esplanada selecta da Praça de Lisboa com um tasco da Rua de Trás, acertam o passo da cidade pelo atraso dos autocarros, falam-lhe de sonho e ilusão nas mãos dadas dos amantes.

“Como nunca viajava com máquina fotográfica, acabava por passar muito tempo a olhar para tudo aquilo que sentia necessidade de reter.” Estas palavras de Afonso Cruz, que podemos encontrar no seu livro “Jalan Jalan” (Companhia das Letras, Novembro de 2017), parecem harmonizar na perfeição com o olhar pausado de Sérgio Jacques ante o formigar que se adivinha à sua volta. É o Porto gentrificado, o Porto turistificado, uma cidade tomada diariamente de assalto por gente das sete partidas do mundo, gente de passagem, de rosto fugaz, voraz na urgência de tudo registar com a sua câmara fotográfica ou telemóvel. Que talvez daí a umas horas estará a muitos milhares de quilómetros de distância, exausta, levando consigo cinco mil imagens guardadas nos cartões de memória. Mas o que viu, realmente? Pelo que vi e senti, pelo que me levou a pensar e a imaginar, esta é uma exposição que recomendo vivamente. A salinha é acanhada, as imagens são poucas e o custo do bilhete – com o pretexto de que “há outras coisas para ver” –, é um escândalo. Ao menos não vai precisar de subir os degraus todos e esta “torre” do Sérgio Jacques é daquelas que vale a pena descobrir.

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