TEATRO: “Para Vós”
Criação
e Direcção Artística | Claudia AndradeInterpretação | Claudia Andrade e sete seniores
Apoio à Encenação | Montse Bonet
Apoio à Dramaturgia | Joana Bértholo
Direção de Produção | São Correia
Vídeo e Registo Fotográfico | Patrícia Poção
Figurinos
| Ruy Malheiro
Produção | A Caravana – Associação Cultural
Centro de Artes de Ovar
03 Mai 2019 | sex | 22:00
“Ó minha mãe deixe-me ir à barra
ver o farol
Que eu vou lá e torno a vir na carroça
do pitrol”
Separados entre si por mais de 8.000
quilómetros, Goa e Canelas, no concelho de Estarreja, são os pontos
de partida duma história autobiográfica, contada na primeira pessoa
por Cláudia Andrade e tendo como foco a avó Alice e a avó Maria.
Trata-se duma peça sobre os lugares da memória, reclamando para o
presente um passado que não se encontra escrito em lado nenhum,
simplesmente habita algures na memória. É, assim, um olhar sobre
as memórias das avós, que não apenas as da criadora deste
espectáculo, mas de todas as avós cujas histórias se foram
desvendando ao longo dum exaustivo processo de recolha e criação
artística, finalmente agregadas neste impactante “Para Vós”.
“Porque é que a família não se
voltou a sentar toda à mesma mesa depois que a avó morreu?” Ao
falar das suas avós, Cláudia Andrade abre as portas da memória do
espectador, convidando-o a avaliar a dimensão afectiva dos laços
que o prendem àqueles que o antecederam, através dum conjunto de
questões transversais à generalidade das famílias. Dos
acontecimentos históricos aos pequenos episódios domésticos - as cantigas de outrora, as sanguessugas agarradas às pernas na monda do arroz, as lendas e mitos que a própria memória ajuda a alimentar -, é
todo um processo de “recuperação do tempo” que flui por
intermédio da própria memória e que resulta naquilo que são os
traços identitários de cada um.
Assente numa dramaturgia com tanto de
simples como de eficaz, “Para Vós” lança ainda em palco sete
não-actrizes, todas elas séniores do concelho de Ovar, reforçando
o cunho realista da peça ao enriquecerem-na com as suas próprias
histórias e memórias. Ficar viúva e ter de começar a vida de
novo, emigrar para França nos idos de 1968, aprender a nadar no
Centro Português de Caracas, entrar para a função pública e
receber uma casa, dar dois contos do primeiro ordenado aos pais e
ficar com 750$00 para si, regressar em 1975 numa ponte aérea ou o nascimento do primeiro neto são
alguns dos factos marcantes da vida destas avós, partilhados com
toda a naturalidade e dispostos num “estendal de estórias”
comovente e sensível. Entre a memória e o coração, “Para Vós”
é um cântico terno e delicado em forma de teatro, daqueles que nos
põem um brilhozinho nos olhos e nos aquecem a alma.
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